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  • A barca solar de Rá
    Iniciado por AndreiaLi
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AndreiaLi
A barca solar de Rá

Quando as primeiras manchas do crepúsculo tingem o horizonte egípcio, Rá, suprema divindade solar, depois de haver atravessado o universo em sua faiscante barca, prepara-se para ingressar no Amanti, o nocturno reino subterrâneo. Lentamente, a embarcação ruma par a boca de Nut, a deusa dos céus, sob o impulso que lhe imprimem os remadores de braços lustrosos de essências balsâmicas e revigorantes. Postado na proa da barca está Seth, um dos filhos de Geb, o deus da terra, e da deusa Nut. Apesar de seu carácter duvidoso, Seth recebeu essa incumbência como prêmio de consolação de seu eterno rival. Enquanto isso, Rá, de pé e em meio aos remadores, dá as últimas recomendações a seus comandados. — Que a ninguém falte o vigor nos braços, sob pena de minha sagrada ira! — exclama o Deus solar, cujo grande olho místico a tudo acompanha atentamente. O coruscante disco vermelho que brilhou o dia todo acima de sua cabeça vai, aos poucos, perdendo o brilho, à medida que as Doze Portas da Noite se aproximam. A cabeça de Rá abandona, aos poucos, sua antiga forma de falcão para ir adquirindo a de um carneiro de grandes chifres anelados, enquanto a barca ingressa nas águas escuras e revoltas do Amanti. Já se divisa, agora, o primeiro dos doze grandes portões que o Deus deverá solenemente atravessar. — Vamos, remem! — repete o sagrado Rá, com uma voz meio caprina.

Um a um vão sendo transpostos os portões que representam as doze horas nocturnas. São regiões escuras e desoladas, que somente a perícia do divino barqueiro pode vencer. Pelas margens dos lagos que a barca cruza vêem-se deuses, na maioria sem forma ou mumificados, que fazem as honras ao Deus visitante. Ha, também, além de réprobos que sofrem o castigo das ofensas perpetradas à divindade, muitas serpentes, ora erguidas e sibilantes, ora abatidas e agonizantes. Já quase no final da viagem, Rá volta-se para seus comandados e exclama: — Estamos perto de ingressar no círculo onde governa Osíris, senhor dos mortos! Seth, inimigo mortal do Deus que ele próprio assassinara por meio de uma pérfida armadilha, rilha os dentes de raiva: "A pior parte da viagem!", pensa ele, encolerizado.

"Por que não suprimem este trecho aborrecido do roteiro, afinal?" Nas margens os mortos recebem a barca com alegria, pois Rá é o bisavô do Deus subterrâneo. — Seja bem-vindo, Deus solar, aos domínios do Senhor Osíris! — exclamam as vozes em uníssono. Sentado num trono elevado está Osíris, portando a "ankh" (o emblema da vida) e seu ceptro recurvo. Diante dele, uma deusa mumificada segura uma balança, na qual devem ser pesados os corações de todos aqueles que ingressam definitivamente nos domínios de Osíris. Conforme o lado para o qual pendem os pratos, fica decretado o destino do morto: ou a felicidade suprema ou a aniquilação nos dentes afiados de "Babai, a Grande Devoradora", uma besta que tem a cabeça de um crocodilo, o corpo de um leão e o traseiro de um hipopótamo, Do outro lado estão os 42 demónios dos infernos que a tudo observam, expectantes. — Agora vamos penetrar nas cavernas do Ocidente, onde tudo é treva e desolação — anuncia Rá.

De facto, tudo ali vive na mais absoluta escuridão e nem mesmo Rá, com todo seu esplendor, pode enxergar coisa alguma. Um rio de águas turvas e encapeladas, ornadas por serpentes negras, torna a travessia extremamente perigosa.

Então, algo verdadeiramente extraordinário começa a acontecer com a barca. Lentamente, ela vai assumindo o formato de uma grande serpente — a sagrada serpente Mehen —, meio infalível que Rá engendra para poder transpor com segurança as terríveis águas. Aos poucos, Rá vai deixando a zona perigosa, levando adiante dois grandes peixes de nadadeiras coloridas, que, a exemplo de batedores marinhos, vão conduzindo a barca — outra vez em sua forma original — para o último e mais perigoso dos portais que Rá deve transpor para voltar novamente a superfície do dia. Um silvo arrepiante faz-se ouvir no negror da noite. Embora já se possam distinguir, muito ao longe, alguns ligeiros tons esmorecidos, prenunciando o dia ao qual Rá pretende retornar, ainda estão o Deus e os demais sob o império da noite mais profunda.

Esteja alerta, Seth, para o terrível perigo que se aproxima! — brada Rá, empunhando sua comprida e afiada lança. O Deus vermelho, que está a frente da barca, tem um dos pés colocado na borda dianteira da nave, a fim de manter o equilíbrio. Suas feições severas não traem o menor sinal de receio quando a barca aproxima-se de um imenso pico rochoso. — Apópis maldita! — brada Seth, com destemor. — E em vão que seu corpo se oculta no seio das águas, pois já conhecemos bem suas solertes artimanhas! Nesse momento, a serpente medindo algo em torno de trezentos metros ergue-se do abismo infernal como uma prodigiosa coluna negra de escamas superpostas, a despedir reflexos de um jade espelhado e fosforescente. — Você, novamente...! — brada Rá, frente a frente, outra vez, com sua mais terrível inimiga.

Enquanto isto, Seth, senhor dos ventos e das tempestades, faz desencadear uma tremenda tempestade, tão forte que mesmo a Rá parece demasiada. (Na verdade, ao Deus solar desagradam tanto a noite tenebrosa, representada pela terrível serpente, quanto a tempestade furiosa, representada por Seth.)

Para trás, maldita! — exclama Seth, fazendo rugir com maior violência ainda a tempestade. A serpente gigantesca, ainda erecta, inclina agora a sua grande cabeça negra na direcção dos ocupantes da barca. Seus dois olhos de pupilas verticais lançam um brilho escarlate ameaçador, enquanto uma língua fendida surge do interior de sua boca. Seth, então, tomando de sua lança, arremessa-a certeiramente na fenda da boca da cobra, que lança um terrível grito de dor — É a sua morte, Apópis! — brada Rá, feliz com o triunfo sobre a inimiga. O réptil gigantesco tomba com grande estrondo, mergulhando nas profundezas do lago negro. — Agora basta, vilão! — diz o Deus solar, nada satisfeito com a atitude de Seth, que continua a promover alegremente o seu temporal.

— Ora, sossegue e deixe que eu comande os elementos a minha vontade! — exclama o inconsiderado Deus, sem dar atenção as palavras de Rá. "Maldito atrevido!", pensa Rá, desgostoso. "Toda a noite é a mesma coisa!" — Termine já com isso ou mandarei meus remadores expulsarem-no de minha barca! — diz o Deus do sol, disparando chispas de Ódio de seu grande olho solar, que, aos poucos, vai readquirindo outra vez o brilho intenso. — Oh, tente só para ver se não lanço meus raios e ventos sobre sua barca! — diz Seth, agora em aberto desafio. Este derradeiro ato de arrogância é o termo final para que Rá abandone seus últimos restos de paciência. — Remadores, lancem para fora de minha barca esse insolente! — diz Rá, pondo toda a ira em sua voz. E dessa maneira o pérfido Seth é lançado para fora da barca antes que Rá possa surgir outra vez no horizonte trazendo ao dia a luz de sua vivificante luminosidade.

Fonte: Templo de Apolo

panito
Realmente o mundo egípcio tem ainda muito por descobrir..

Um trecho muito fixe =P