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  • "A Casa das Sombras" - Grândola
    Iniciado por Maria Orsic
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Habitualmente, a vila de Grândola é associada à icónica canção de Zeca Afonso, uma das senhas da Revolução dos Cravos, ou aos empreendimentos turísticos de luxo do litoral (Carvalhal, Melides, Troia e Comporta). Mas a "Vila Morena" tem também um lado menos conhecido, tenebroso e arrepiante.

Numa visita que fiz recentemente a essa localidade alentejana, tomei conhecimento da existência de um edifício imponente e misterioso, chamado popularmente "Casa das Sombras", cuja história me contaram.

De acordo com esse relato, a casa pertenceu, nos anos 60 e 70 do século passado, a um dos mais ricos e poderosos proprietários agrícolas de Grândola, Manuel Pereira Barradas (mais conhecido por "Manel das Sesmarias"), dono de uma enorme fortuna e detentor de vastas herdades nos concelhos de Grândola e de Santiago do Cacém.

Casado com a filha de uma das mais ilustres e tradicionais famílias de Alcácer do Sal, de seu nome Maria Barahona de Lynce Núncio, teve dela um único filho chamado Henrique Barahona de Lynce Núncio Pereira Barradas.

Segundo parece, Manuel Barradas apresentava algumas das piores características dos latifundiários alentejanos, com a sua personalidade arrogante e autoritária, tratando com desprezo os pobres jornaleiros que trabalhavam em condições desumanas nas suas propriedades. Não era, por isso, surpreendente que provocasse sentimentos de medo e de ódio nessa gente humilde e explorada.

Por vários motivos, o ano de 1974 trouxe súbitas e dramáticas mudanças na vida deste casal rico e privilegiado. Em Fevereiro desse ano, o seu filho, a cumprir serviço militar na Guiné-Bissau, morreu na queda do helicóptero que tripulava, atingido por um míssil lançado por guerrilheiros do PAIGC. Desapareceu assim tragicamente o seu único descendente e herdeiro.

Pouco tempo depois, um outro acontecimento traumático afectou ainda mais profundamente as suas vidas: a Revolução de 25 de Abril. Sendo associado ao Antigo Regime, o casal passou a sofrer as represálias políticas e sociais de um Alentejo em ebulição revolucionária.

Nos primeiros meses de 1975, as suas propriedades foram ocupadas e expropriadas por trabalhadores agrícolas no âmbito de uma Reforma Agrária que subverteu por completo a estrutura fundiária alentejana.

Atingidos por esse duríssimo golpe no seu património, Manuel Barradas e a mulher viveram acossados na sua casa de Grândola, enfrentando um ambiente cada vez hostil. Foram acusados de "fascistas" e "reacionários", sendo constantemente ameaçados de morte por uma população que não lhes perdoava o seu antigo estatuto de fortuna e poder.

Numa questão de meses, as paredes da casa assistiram a uma verdadeira história de horror suicida. Em Maio de 1975, Maria Barahona, deprimida pela morte do filho e desesperada com a situação de isolamento social a que estava condenada, pôs fim à vida, atirando-se da escadaria da casa. Por sua vez, em Setembro, é a vez do seu marido se matar num dos quartos, desferindo fatalmente um tiro na cabeça.

Desde então, a vida desta casa foi atribulada e marcada pelo signo do inexplicável. Herdada por familiares distantes do casal, foi vendida e ocupada duas ou três vezes, mas sempre por curtos períodos.

Segundo parece, quem lá vivia dizia observar sombras fantasmagóricas a deslizar pelas divisões da casa e outros fenómenos estranhos (móveis e outros objetos que se moviam sozinhos, vozes que se ouviam em partes da casa desabitadas e lâmpadas que se acendiam e apagavam sem motivo aparente).

Desde então, a casa está votada ao abandono, como se a tragédia do Passado continuasse a projetar no Presente as suas sombras inquietantes. A acreditar na vox populi, não só metafórica mas também literalmente...


"NIEMAND BLEIBT HIER"

História arrepiante! E fora a parte sobrenatural, é muito possível que seja verdadeira. Existem muitas histórias semelhantes no Alentejo, uma vez que as elites proprietárias de terrenos eram parte essencial da política económica do Estado Novo, motivo pelo qual o governo reprimia as populações rurais com as suas forças da ordem. Depois veio a revolução de 1974 e a reforma agrária, e tudo mudou... até recentemente, quando se voltaram a ouvir os brados da escravatura no Alentejo, desta vez não sobre as populações, mas sobre pobres trabalhadores vindos da Ásia.

Quanto à casa em si, parece-me ser mais antiga do que a família retratada neste relato, talvez dos finais do século XIX, ou dos princípios do XX. Reparem como em geral é neste tipo de casas que surgem as lendas de assombrações: edifícios de aparência pesada, com poucas e pequenas janelas, elementos decorativos antiquados. Neste caso, a decoração da própria ~porcaria~ parece sugerir uma cripta E no entanto, constituem uma valiosa parte do património edificado alentejano, à espera de serem reaproveitadas... ou, infelizmente como em muitos casos, demolidas, e substituídas por prédios sem qualquer valor histórico ou arquitectónico.
Someone once told me that time was a predator that stalked us all our lives, but I rather believe that time is a companion who goes with us on the journey, and reminds us to cherish every moment... because they'll never come again.

O problema da reforma agrária é que não foi imparcial. Muitos aproveitaram-se para se apropriar de terras que era propriedade de outras famílias. O caso do meu avô foi um deles, sendo ele anti-regime, viu-se expropriado das terras que pertenciam à sua família à anos. Segundo ele, tudo aconteceu porque rejeitou ser militante do partido comunista.
Quanto à casa em questão, acho que dava um excelente hostel.
Enquanto te podes mexer, treina o corpo. Quando não te podes mexer, treina a mente.


Citação de: Simba33 em 09 outubro, 2023, 12:37
Onde fica ?


Na Avenida Jorge de Vasconcelos Nunes, em Grândola.
"NIEMAND BLEIBT HIER"