Contemplar ou correr

"Naquele dia, por nenhuma razão em particular, decidi fazer uma pequena corrida".

Assim começa "a longa cena da corrida" do filme Forrest Gump e assim começou também a corrida em que muitas pessoas se encontram.

Sem nenhum motivo em particular, começamos a correr. E quando chegamos a um objectivo pensamos: bem, já que vim até aqui, mais vale dar a volta e continuar a correr. Vamos correndo, de objectivo em objectivo, sem ter realmente um objectivo concreto. Inventamos objectivos à medida que vamos correndo, apenas para justificar o facto de estarmos a correr.

Por muito que a corrida se estenda de um oceano a outro, ela nunca acaba porque não é isso que nos move. Mas preferimos concentrar-nos no objectivo, no fim, em vez de pensarmos no como é que tudo começou. Não pensamos nesse momento inicial porque, lá bem no fundo, sabemos que se o fizessemos encontraríamos a inquietação primordial, aquela que nunca nos deixa sossegar. É por ela que sentimos necessidade de movimento, de correr - na verdade, "fugir" seria uma melhor palavra.

Ao contrário do Forrest, muitas pessoas não pensam nessa inquietação enquanto correm. Para a maioria nem sequer existe uma percepção clara de que ela existe e por isso correm toda a vida, por isso se centram no objectivo que inventaram para a corrida.

Forrest teve a sorte de ter tido clareza de espírito para pensar durante a corrida. Pensava muito. Correu, sim, mas enquanto corria nunca deixou de contemplar a inquietação que o fazia correr. E um dia, de tanto contemplar a inquietação que nunca desaparecia, ele percebeu o quão cansado estava de correr. Correr já não fazia sentido, correr não era a resposta.

Estava na hora sossegar a mente e o coração, enfrentar a inquietação e voltar para casa. Ou nas palavras dele: "A minha mãe sempre me disse que temos de pôr o passado para trás das costas antes de podermos avançar. E acho que a minha corrida tinha a ver com isso".

Ele demorou 3 anos, 2 meses, 14 dias e 16 horas. Muitos correm a vida toda e nunca chegam a essa conclusão.


Excelente filme, vale a pena recordar:
http://www.youtube.com/watch?v=QgnJ8GpsBG8

Muitos correm atrás de um objectivo, mas não aproveitam a "viagem". Mal sabem eles que a verdadeira aprendizagem e o prazer que daí retiram está na viagem propriamente dita e não no destino! O resultado? Vão continuar a fazer uma corrida desenfreada até ao próximo objectivo.