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  • O porquê e a utilidade dos sonhos
    Iniciado por F.Leite
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Parte 1

    "Um colega de trabalho que se fazia muito amigo colocou-me em cheque perante o patrão só para ficar bem visto por ele. Ao saber disso comecei a matutar num plano que me servisse de vingança, a imaginar uma forma de o punir e de virar a situação a meu favor. Era o meu emprego que estava em jogo e eu não podia ficar simplesmente à espera do desenrolar dos acontecimentos. Tinha que agir em minha defesa."

    Isto é o que normalmente acontece no nosso dia a dia. Somos confrontados com situações que põem em jogo o nosso bem estar e então "imaginamos e programamos" uma forma de nos defendermos e muitas vezes até de nos vingarmos. Isto fazemos em consciência (acordados).

    Acontece que em nós existe também o instinto de sobrevivência e esse foi criado para preservar a vida do corpo mesmo à revelia da consciência. Sonhar acordado (imaginar) uma vingança ou uma resposta a uma afronta, muitas vezes deixa-nos cegos para as consequências. Para tentar minimizar os efeitos nefastos que a consciência pode provocar no corpo, entra em ação o inconsciente gerando os sonhos cuja função é gerar respostas saudáveis para as situações que o corpo no seu todo enfrenta no dia a dia.

    O inconsciente tem acesso direto às memórias de tudo o que nos aconteceu durante a vida e até mesmo de memórias herdadas dos nossos antepassados e é na experiência de vida que são as memórias, que vai procurar uma solução por comparação. Vai ver se já algo idêntico nos aconteceu antes e medir as consequências para o corpo da forma como agimos anteriormente. Perante o resultados das memórias guardadas define uma forma de reagir à situação que presentemente enfrentamos. ou mesmo de situações que estejam por resolver.

    É a esse trabalho do subconsciente que nós chamamos de sonhos, sonhos esses que ao tentar traduzir, nos esquecemos que não o podemos fazer de uma forma racional, isto é, segundo a nossa inteligência. E não o podemos fazer porque os sonhos não são exclusivo dos humanos, mas sim uma característica de todos os mamíferos. Herdámos essa capacidade de sonhar porque ela é vital para a nossa sobrevivência e evolução como o animal que somos fisicamente.

    Por isso mesmo os sonhos parecem confusos e não ter um raciocínio lógico segundo a nossa inteligência, mas na realidade têm-no se os virmos da mesma forma que uma criança de tenra idade entende um conto de fadas que os pais lhe lêem para ela adormecer. Tudo se define na conclusão da história que se conta ou da história que se sonha. Os sonhos são uma avaliação irracional de causa e efeito porque não fazem uso do sentido critico consciente para ponderar resultados ou variáveis.

    Para não alongar mais o texto deixo-vos com este preâmbulo para que pensem um pouco nos vossos sonhos e ainda hoje tentarei explicar como tudo funciona na nossa mente e na utilidade que os sonhos têm na nossa sobrevivência.

   

   

Acho que nem Carl Jung explicava tão bem!!! O mundo dos sonhos é de veras um mundo encantado de importância primordial... o Dreamtime ainda hoje é a base das crenças dos aborígenes na Austrália entre outros povos indígenas.

Os teus sonhos vão te falar do teu jeito e por muito que possam não fazer sentido, são exactamente o que é naquele momento, cabe te a ti desenrolar o novelo do seu significado.  

Sonhos podem ser muita coisa, espelhos subconscientes, premonitórios, flashes de passados entre outros, tão vasto é o inconsciente...

Namastê

Parte 2

     O nosso maior erro como seres inteligentes é querer entender a obra pelo aspecto exterior e descurar a parte mais importante que a sustenta, o alicerce e a estrutura. Os sonhos não fogem a essa observação e por isso, para entender os sonhos precisamos de observar os sonhos num recém nascido.

     Um recém nascido sonha e isso qualquer mãe comprova pelos trejeitos faciais e movimentos dos braços do bebé. E isso obriga a uma pergunta: Se as histórias dos sonhos têem por base memórias de experiências vividas como pode um bebé sonhar se ainda não memorizou experiências de vida?

     A resposta está no processo evolutivo do nosso corpo e da nossa mente.

     Na natureza existem dezenas de espécies de cogumelos venenosos e embora os animais passem por eles na busca de alimento não os comem e não os comem simplesmente porque o instinto lhes diz que não o podem fazer. Como pode isso ser possível? Simplesmente porque é uma memória que herdaram dos seus antepassados que se viram quase a ser dizimados por usarem esses cogumelos como alimento. Ficou registado nas suas memórias instintivas que esses cogumelos matam e eles passaram a "sofrer de cogumelofobia" (o termo não existe, serve unicamente como forma de expressão).

     E como sabem os animais que são uns cogumelos específicos e não os cogumelos em geral?. Sabem-no porque as memórias se baseiam em imagens, sons e cheiros. Embora nunca os tenham visto, ao vê-los pela primeira vez e ao sentir-lhes o cheiro o seu subconsciente busca nas memórias e encontra lá a correspondência com a imagem e cheiro do cogumelo e o sentimento de medo a eles relacionado e que foi o medo da morte que ficou gravado no ADN dos seus antepassados.

     Acho que este exemplo é suficiente para esclarecer o que pretendo explicar. Nós herdamos memórias dos nossos antepassados, mas não quaisquer memórias. Unicamente daquelas que excitaram nos nossos antepassados (familiares)  sentimentos muito fortes e que contribuíram para ultrapassar fases decisivas das suas vidas.

     Estas memórias contudo não estão disponíveis para acesso da nossa consciência no estado normal de vigília. Mas temos acesso a elas pelo processo chamado de "regressão de memória por hipnose". O problema é que o subconsciente que é a parte que "fala e age" durante a hipnose, não distingue as memórias e se as tem guardadas, tem-nas como suas, como as tendo vivido e ao agir dessa forma induz a ideia de vidas passadas.

     Sonha um bebé humano como sonha um bebé cão, gato, vaca, leão ou bebé tigre e sonham como forma de sobreviverem no mundo que os rodeia. E não sonham com memórias suas porque simplesmente ainda não viveram o suficiente para terem memórias próprias. E ninguém sonha por capricho, sonha porque os sonhos são necessários à sobrevivência das espécies.

     Ao longo da vida vamos somando experiências e avolumando as nossas memórias e os sonhos vão traduzindo esse conteúdo memorizado. O interessante é como tudo isso funciona no nosso subconsciente. As nossas memórias não são armazenadas como as páginas de um livro. São armazenadas de acordo com o impacto que tiveram na vida da pessoa. Para serem retidas a longo prazo tiveram que despertar sentimentos fortes e dessa forma obrigaram o corpo a gerar bioquímicos específicos para cada sentimento que forçaram o seu armazenamento no cérebro pois tudo o que acontece na nossa mente é baseado em reacções químicas e eléctricas.

     O nosso cérebro, tal como o nosso coração, nunca param de trabalhar. Se algum deles para é a morte do corpo. Mesmo a dormir o subconsciente tem necessidade de trabalhar mantendo dessa forma o cérebro ativo. E o trabalho do cérebro durante as horas em que o corpo dorme, baseia-se em antecipar qualquer situação que de alguma forma possa prejudicar o corpo. Se à um problema que em consciência nos preocupe, o subconsciente vai por força criar um sonho com uma situação similar e testar uma solução para o caso de, em consciência, não sermos capazes de o fazer.

     Mas o subconsciente não distingue o heroísmo ou a cobardia, nem o que é bom ou mau no aspecto moral. O nosso subconsciente foi sendo programado ao longo da nossa vida de acordo com a nossa maneira de agir para resolver os problemas que nos apareceram. Então o subconsciente de uma forma muito simples entende que se essa forma de agir se mantiver, o corpo também se manterá vivo. Ele então percorre memórias gerando sonhos com situações que estejam de alguma forma relacionadas com o problema que a consciência tem para resolver, e testa se a forma normal de nós agirmos superará o obstáculo que temos pela frente.

     Ao subconsciente não lhe interessa se vamos sofrer ou não com a solução, para ele conta é que o corpo sobreviva. Por isso se a pessoa por norma enfrenta os adversários, nos sonhos nunca se vê a fugir deles, mas se a pessoa é insegura e com pouca auto-confiança, nos seus sonhos vê-se a fugir e a esconder-se. Os sonhos acabam por ter esse efeito que se traduz em manter a mente fechada a mudanças de comportamento. É como que o treino da personalidade, e que faz com que no dia a dia seja difícil alterar a nossa postura nas nossas relações em sociedade.

     Exemplo: Eu por costume acobardo-me quando sou desafiado. A vontade é responder à letra e até mesmo enfiar a mão na cara do adversário. Mas como fui ensinado a não agir dessa forma e isso se tornou um hábito, nos momentos de crise algo em mim me incita a manter a calma e a não responder. Muitas vezes digo a mim mesmo que à próxima vou-lhe às fuças, mas quando a próxima acontece a solução é a mesma do costume, diplomacia em lugar de violência.

     Acontece assim porque os meus sonhos também não incluem violência física. Nos meus sonhos eu vejo-me sim a interagir e a conversar com pessoas, a contornar problemas e a procurar soluções que às vezes são as mais bizarras que se podem imaginar. Eu posso dizer que a minha personalidade e os meus sonhos se moldaram na minha mente de tal forma que, tirando a bizarria do conteúdo dos sonhos, a minha forma de reagir nos momentos cruciais, é a mesma que eu uso nos sonhos. Diplomacia e busca de soluções e respostas.

     O meu subconsciente nos momentos de crise impede que o organismo produza os bioquímicos que seriam necessários para que o cérebro aceitasse e permitisse uma reacção com violência. Eu até queria dar dois murros, o meu subconsciente, esse não o permite. Seria necessário ter a vida em risco para chegar a esse extremo.

     É assim comigo e é assim com todos pois a mecânica do funcionamento da mente é igual sem excepção. Por isso a nossa personalidade não muda só porque nós queremos ser diferentes. Estamos presos a uma maneira de agir que os sonhos se encarregam de manter até ao dia em que conseguirmos alterar essas mesmas memórias.

     Mas muito mais há para falar sobre os sonhos.