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  • Fantasma na adega
    Iniciado por Templa
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Directamente das minhas memórias, mais um conto:

A casa tinha à frente uma espécie de alpendre de madeira que o tempo foi comendo, depois de votado a um imenso abandono. A dona tinha ido para África com o marido e os dois filhos, e raramente vinha de férias. Uma ou duas vezes, quando eu, depois, em casa da avó dos garotos, uma outra habitação, brincava com eles numa idade ainda muito tenra, a minha e a deles. E talvez a casa não merecesse grande investimento, por ter eventualmente algum defeito, muito mais do que no esqueleto, na própria alma.
Nessa altura, quando comecei a brincar com os meus novos amigos, ouvi dizer que a casa de férias deles era assombrada.
Era sobretudo na adega que aconteciam coisas. O vinho sumia, ouviam-se barulhos e vozes estranhas vindas de todo o lado e de lado nenhum. Até pessoas da família já lá tinham levado umas valentes bofetadas, a troco de atitudes, gestos e palavras que tinham irritado solenemente os membros do além. Via-se, estes faziam ali finca-pé e jus a um título de propriedade, sabe-se lá de que remotos tempos. Andavam por lá já não havia memória desde quando.  
Era sim um fantasma, ou vários, ninguém sabia de quem. Um deles era homem, porventura um antigo dono da casa, um bêbado, como dava a entender a sua predilecção pela adega. E, quem herdassea a casa, tinha forçosamente de levar atrás os mortos que, para além do cemitério, faziam daquele espaço a sua morada perpétua, talvez não uma casa de férias como aquela era para os miúdos, mas uma onde viviam mortos o ano inteiro e a atazanar constantemente a vida dos vivos.
Eu nunca lá vi nada. Apenas havia um quarto interior de que não gostava, cuja porta era uma arcada que dava para uma sala, coberta com uma cortina,  e eu não sabia se o meu medo era pelo quarto em si, ou se pelas histórias que ouvia contar, muitas das quais já nem me lembro. Também não fui lá assim tantas vezes. Só me lembro daquele dia em que lá vi, sobre uma peanha, na dita sala, a Santa Filomena, depois de a igreja a ter apeado do altar da santidade, relegando-a para o estatuto de uma pessoa normal que teria apenas vivido e morrido como tal e sem direito às honrarias dos santos. A imagem regressou, pois, à casa dos donos, que a tinham oferecido à igreja, sabe-se lá para cumprir que promessas...
Muito antes de mim e das minhas brincadeiras na casa, a mãe dos meus amigos, menina e moça, estudava longe da velha aldeia. Era para se descartar do futuro no pó da terra, a tratar da horta e das vinhas. Tinha de ser professora. A terra só dava alguma coisa para três ou quatro senhores feudais, que chamavam a si a mão-de-obra do povo,  praticamente a troco de uma côdea de pão para a boca de famílias inteiras, quase sempre numerosas.
Um dia, mais uma vez a adega foi o palco eleito para as manifestações do além. Estava lá o pai da rapariga, talvez pensando nela e nos seus êxitos, ou fracassos,  do exame, ocorrido nesse mesmo dia e sensivelmente àquela hora. Estava tão descansado quanto a história sinistra da adega o permitia, quando a voz lhe diz peremptoriamente:
- A tua filha gatou...
Passado pouco tempo, a rapariga, chorosa como uma Madalena, dava-lha a notícia pelo telefone, igual à que ele soubera pela boca de um fantasma.
A casa foi entretanto reconstruída e, por causas das leis de construção, o alpendre deixou de se debruçar sobre o largo da aldeia, ali junto à igreja. Agora tem umas escadas exteriores e o dono, o rapaz com quem eu brincava, vai lá de vez em quando. Viveu aí durante um pequeno período, depois de regressar de Angola no pós 25 de Abril, mas não se apegou muito ao lugar...
Houve um tempo em que eu, apaixonada por histórias de fantasmas, na altura em que o meu amigo veio avisar-me da sua morte, quis saber junto da única arrendatária que se conheceu à casa, se algum dia lá tinha visto ou ouvido alguma coisa estranha.
Sem grande convicção, pareceu-me, disse-me que não... Mas, já não morava lá e talvez alguém lhe tenha pedido para negar eventuais experiências dela e da família por lá. Talvez fosse altura de lhe resgatar a fama de assombrada e de lhe dar uma vida tão normal como a de qualquer outra casa da pequena aldeia.
Quanto a mim, sempre que passo em frente à adega, do outro lado e numa outra rua, na que vai dar ao cemitério - a casa é no cruzamento do Largo da Igreja - digo sempre  com os meus botões:
Cá está a casa assombrada!... Pelo menos, da fama não se livra!...  
Templa - Membro nº 708


Adorei a história!!! :laugh: mas nesta parte
- A tua filha gatou
desculpa não conheço a expressão...

É tipicamente transmontana. Vou ver se me consigo lembrar de mais umas coisitas...

Abraço

Templa
Templa - Membro nº 708

Sim,ok... mas o que quer dizer????


  A tua filha gatou
 
desculpa não conheço a expressão...

Desculpa Templa mas sou transmontana e não conheço a expressão!

explica para nós se faz favor  :)

Ai és transmontana? de Onde? E se calhau já entrou em desuso... Nunca ouviste dizer "aqui há gato", Possivelmente deriva daí. Erro falta,  eu sei lá!...

Até amanhã.
Templa - Membro nº 708

"reprovou" já me esquecia...
Templa - Membro nº 708


Sou de Vila Real«uma aldeia proxima» ;D

Quanto ao "aqui há gato" é claro que  sim :laugh:

mas obrigada pela explicação ;)

:-* Até amanhã

Citação de: ANJOPERDIDO em 13 setembro, 2009, 00:32
Sou de Vila Real«uma aldeia proxima» ;D

Quanto ao "aqui há gato" é claro que  sim :laugh:

mas obrigada pela explicação ;)

:-* Até amanhã


Belos tempos em que me apetecia escrever, agora ando sem vontade. E tu,  AnjoPerdido, que é feito de ti?

Templa
Templa - Membro nº 708