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  • O presente de Natal
    Iniciado por Margarida
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O PRESENTE DE NATAL


Ainda sei o meu nome! Chamo-me Maria Soledad, nasci em Madrid mas vim para Portugal arrastada pelo meu marido.
Que saudades eu tenho desse velho maluco… era maluco, mas era meu! Éramos os dois tontos autênticos, loucos um pelo outro.
Depois de tanta luta, de tantas batalhas e tantos sacrifícios conseguimos educar os nossos 3 filhos e dar-lhes formação universitária para que vencessem na vida.
Hoje graças a Deus estão bem na vida, casados, cada um com o seu cargo importante em empresas de destaque, enfim bem encaminhados como sempre desejei, dando-lhes de igual modo a melhor formação cívica que me foi possível mas acima de tudo dei-lhes uma vida cheia de carinho, conforto e muito amor.
Daria a minha vida caso fosse possível, se algum deles dependesse disso para sobreviver.
Foram ainda 7 anos que gozei da verdadeira lua-de-mel, bom parecia assim embora os nossos corpos já não tivessem o vigor de antigamente.
Havia a paixão renascida, o calor humano que nos unia ainda mais e sobretudo o romance.
Foram dias e dias de carinhos e agrados, o levar o pequeno-almoço à cama, os passeios à beira mar, ou mesmo no parque urbano repleto de pinheiros e eucaliptos onde caminhávamos de mãos dadas, outras vezes abraçados quando o tempo estava frio e sempre nos aquecíamos com o calor do corpo um do outro.
Como eram bons os nossos almoços, sempre com troca de olhares cúmplices, como se fossemos adolescentes a sonharmos com aventuras amorosas e trocas de carinhos às escondidas de todo o resto de gente.
Lembro-me dos Natais que passámos, a entre ajuda que nos era característica, apesar dos afazeres para recebermos os nossos filhos e os nossos netos.
Dias antes de chegarem a nossa casa, decorávamos a árvore de natal ao gosto dos dois, sem atropelos, sem discussões, somente algumas traquinices, umas cócegas aqui, outras ali acabando com um beijo apaixonado como nos bons velhos tempos em que nos conhecemos.
Sinto-me a definhar, aqui estou, sozinha, abandonada neste lar de idosos, uns a dormirem o dia inteiro, outros às brigas e as outras pregadas às televisões.
Perdi o meu querido faz 8 meses, mas desde que os meus filhos me desterraram para aqui, só os vejo de tempos em tempos, esqueceram-se da mãe, de tudo o que me sacrifiquei por eles, enfim não estiveram para me aturar e ainda aproveitaram para se apoderarem de tudo, tudo o que levei uma vida inteira a juntar.
Resta-me esperar pela luz do Senhor, fazer a última viagem para me reunir com todos aqueles que me amavam de verdade.
É triste! Sinto uma tristeza profunda por os meus filhos e os meus netos me terem riscado das suas vidas, como se me tivessem feito um funeral ainda em vida.
Desejei uma prenda de natal, ai que velha tonta eu sou… mas nunca se é velho para receber um carinho, um afecto, foi tudo o que pedi ao meu Menino Jesus e por milagre, exactamente ao fim das 12 badaladas entre a véspera e o dia de Natal, meu Pai colocou-me nos braços do meu amado, rodeada dos meus queridos pais e alguns amigos que vieram ao meu encontro para esta nova vida Celestial.
Graças a Deus, este foi o melhor presente que uma velha como eu poderia receber no Natal.


Alexa Wolf
(Margarida)

in "Espontâneos de Natal 2009"
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

infelizmente os idosos de hoje já não são os matriarcas da família, os sábios a quem todos pediam conselhos, os idosos agora quando já não têm nada para dar são "despejados" no lar, "ai  porque não temos tempo e tal", é o qiue a maioria diz.
não venham para aí dizer que velhos são os trapos, porque há muita gente que os trata como tal.

o teu conto, Margarida, além de ser bonito, retrata a realidade de muitas famílias.

Olha Lena

infelizmente fui quase obrigada a colocar os meus sogros num lar
O meu sogro tinha doença de Alzheimer, fugia de casa, batia na minha sogra e só fazia uma quantidade de coisas que eram de bradar aos céus.

A minha sogra com sindroma de menier e um ouvido morto também já me fazia uma montanha de disparates como deixar o gas do fogão ligado sem chama, as torneias abertas, a fritadeira ligada durante "horas" fora outras coisas.

Com duas crianças, os problemas de saúde do meu marido, e os meus também não aguentei o fardo...

Mas uma coisa é certa, todos os fins de semana estou lá com ela, levo-a a passear a almoçar fora, outras vezes até a Abrantes onde era a casinha dela, que apesar de ser do meu marido, mantive tudo como estava com todas as coisinhas dela, enfim tento dar-lhe toda a atenção possível.

Mas vejo idosos lá que já me agarram a tentarem captar a minha atenção, por quererem também que lhes dê o mesmo que a ela porque as famílias ali os despejaram e se esqueceram da sua existencia.

Este foi um grito mudo que tive de raiva, de desespero e de incoformísmo por haver gente assim...


Enfim no proximo ano terei mais um livro... Não quero chegar a velha" com todos estes pormenores focados.


Margarida
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

tens razão. mas se pessoas como tu tentam estar presentes sempre que possível, outras há que se esquecem, ou por outra, lembram-se no natal porque parece bem.

sabes, também tenho um grito de raiva, que é ver idosos de 80 ou 90 anos ser operados, irem para uma unidade de cuidados intensivos, para quê? não quero com isto dizer que não tenho direito à vida, mas morrer com dignidade não é mais importante?
antigamente as pessoas morriam em paz, na sua casa, na sua cama, rodeada das suas coisas, da sua família, hoje a maior parte dos idosos morrem com tubos na boca, cateters em tudo o que é veia, sonda vesical, sonda nasogástrica, morrem num sofrimento atroz.
sabem, trabalho num hospital, vejo isto todos os dias, parte-me o coração.

mesmo num lar, as pessoas também podem estar rodeadas de afectos e das suas coisas, isso é possível. num hospital é muito diferente...sabes que há famílias que também se esquecem dos idosos n os hospitais...

Sei o que é isso

o meu sogro na ultima fase foi internado devido a problemas no figado...
Era suposto ser operado para lhe retirarem as pedras mas a dita cirurgia com uma nome muita esquisito, era 90% de risco, por isso não foi operado, estávamos a estudar a hipotese de o levarem para o lar de novo visto não haver esperanças...
Mas já não fomos a tempo, numa madrugada teve uma pancrite aguda e ficou-se.

Sofri que nem uma louca porque o adorava, ainda hoje quando estou arreliada com alguma coisa lembro-me dele porque ele me fazia rir mesmo quando eu estava com a neura.

Não sei mais o que poderia ter feito por ele, pois nem férias tive para estar com ele todos os dias no hospital, intercalando com o meu marido e a minha sogra, pois tinha de deixar as crianças no carro porque não os deixavam entrar.

A ultima homenagem que lhe fiz, foi pentea-lo, e ao passar na carreta rumo à igreja, passamos em frente à porta da sua casinha onde fizemos um minuto de silencio.


Enfim sou lamechas, sentimental e sinto uma enorme saudade dele.
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

Aset
É facil falar, mas o grande problema é a sociedade, não existe capacidade numa familia da classe média neste momento para ter os avós ou país em casa, se queres sobreviver e pagar a casa tens que trabalhar, assim só resta uma solução coloca-los numa instituição que possa cuidar deles...

O mesmo se passa com o acompanhamento dos filhos que também é dramático pela falta de tempo.

Aliás antigamente as empresas faziam as festas de Natal para a familia.... agora é as festas de Natal para os copos, inclusive avisam logo para não levarem ninguém, sempre com programa nocturno.

... é um sinal dos tempos e de como os Valores se estão a perder... Infelizmente.

Concordo contigo

Agora imagina também alguém desempregado, é que nos lares com alvará a segurança social contribui em 8o% da mensalidade, em casa seria muito pior...

No entanto o meu desemprego, obrigou-me a desenvolver outras capacidades, outras actividades e sobretudo o tempo que os meus filhos necessitam de mim.

Eu sei... podia ter uma vida bem melhor, com tudo o quera bom e do melhor, sem ter de me preocupar, mas no fundo tenho muito menos mas vejo os meus filhos a crescerem assim pertinho de mim, apreciando cada malandrice cada gracinha.

Margarida
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

Aset
Citação de: Margarida em 09 dezembro, 2009, 20:12
Concordo contigo

Agora imagina também alguém desempregado, é que nos lares com alvará a segurança social contribui em 8o% da mensalidade, em casa seria muito pior...

No entanto o meu desemprego, obrigou-me a desenvolver outras capacidades, outras actividades e sobretudo o tempo que os meus filhos necessitam de mim.

Eu sei... podia ter uma vida bem melhor, com tudo o quera bom e do melhor, sem ter de me preocupar, mas no fundo tenho muito menos mas vejo os meus filhos a crescerem assim pertinho de mim, apreciando cada malandrice cada gracinha.

Margarida

Cá em casa senão trabalharmos os dois estamos lixados, só para as despesas da casa vai um ordenado :)

reparem que, não sou contra o facto de colocarem idosos no lar, sou contra o facto de os abandonarem lá.

é verdade que o custo de vida obriga a que a mulher também trabalhe e não possa só cuidar da família como antigamente, mas isso não quer dizer que se esqueça os idosos no lar, um telefonema, uma visita, não custa nada. existem pessoas que simplesmente os abandonam, acreditem, vivo isso de perto, essas pessoas sofrem imenso de solidão. estão sozinhas rodeadas de gente.

Lena

Isso nenhum dos meus velhotes se podem queixar...
Antes pelo contrário esqueço-me de mim para atender o resto da minha "malta".

Margarida
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

eu só fiz um desabafo, não queria ferir sentimentos.

minha linda não disse o contrário...
Estamos a conversar, não critiquei ninguém nem me senti atingida...
Nem vi da tua parte qualquer tentativa de tal, nem de ti nem de mais ninguém a não ser uma troca de ideias pessoais em que cada um pode ver a situação pela sua perspectiva , nada mais..

Lenita, eu dou aulas na universidade sénior, lido com gente já bastante idosa mas que ainda se mexe, mas memso assim muito só.
Compreendo muito bem o que tens dito...

Margarida
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

Que bom caríssima amiga, haver gente como a Margarida, com gritos, eu não diria mudos, mas interpelativos, de raiva ou desespero de inconformismo ou alerta para situações de tamanha injustiça, ingratidão e negligência entre outras,  para com os idosos, inclusié os não institucionalizados!

O comité nacional de abuso de idosos nos Estados Unidos (National Center on
Elder Abuse, 1998), propõe as seguintes definições de 7 tipos de abuso para idosos não
institucionalizados, com base numa análise e revisão das definições já existentes:
a) Abuso físico: o uso não acidental da força física que pode resultar em
ferimentos corporais, em dor física ou em incapacidade. As punições
físicas de qualquer tipo são exemplos de abuso físico. A sub
medicação ou sobre medicação também se incluem nesta categoria;
b) Abuso sexual: contacto sexual não consensualizado de qualquer tipo
com uma pessoa idosa;
c) Abuso emocional ou psicológico: inflicção de angústia, dor ou aflição,
por meios verbais ou não verbais; a humilhação, a infantilização ou
ameaças de qualquer tipo incluem-se nesta categoria;
d) Exploração material ou financeira: uso ilegal ou inapropriado de
fundos, propriedades ou bens do idoso
e) Abandono: a deserção de ao pé de uma pessoa idosa por parte de um
indivíduo que tinha a sua custódia física ou que tinha assumido a
responsabilidade de lhe fornecer cuidados.
f) Negligência: recusa ou ineficácia em satisfazer qualquer parte das
obrigações ou deveres para com um idoso.
g) Auto-negligência: comportamentos de uma pessoa idosa que ameaçam
a sua própria saúde ou segurança. A definição de auto-negligência
exclui situações nas quais uma pessoa idosa mentalmente capaz (que
compreende as consequências das suas decisões) toma decisões
conscientes e voluntárias de se envolver em actos que ameaçam a sua
saúde ou segurança.

In :
http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/4423/3/abuso%20e%20neglig%C3%AAncia%20-%20ciencias%20criminais.pdf



Citação de: CientificaMente em 03 janeiro, 2010, 06:05
Que bom caríssima amiga, haver gente como a Margarida, com gritos, eu não diria mudos, mas interpelativos, de raiva ou desespero de inconformismo ou alerta para situações de tamanha injustiça, ingratidão e negligência entre outras,  para com os idosos, inclusié os não institucionalizados!


Cientifica minha linda

Eu sou um alma rebelde que não se cala com as injustiças que homens e mulheres infligem uns aos outros.
A escrita e outras artes a que estou ligada, são os canais que utilizo para me fazer ouvir.
Tento ser o mais correcto p+possível mas como pessoa vulgar que sou, igual a tantas outras também cometos erros, mas sei dar o braço a torcer quando me provam que estou errada.
Não é à toa que em várias associações de letras e não só sou uma persona non grata, a minha voz é incómoda!

No entanto há quem pense como eu,e me dê oportunidade de espernear à vontade sem censuras como alguns jornais onde colaboro com algumas crónicas.
Depois tenho o lado mais calmo e brincalhão e acho que todos aqui no Fórum já aprenderam a conhecerem melhor, por isso de vez em quando escrevo umas histórias que também vou colocando aqui.
Esta é uma delas, infelizmente quando vou visitar a minha sogra todos os santos fins-de-semana, vejo gente triste a chorar, as empregadas a comentarem que passou mais uma semana e em vários meses certos idosos não tiveram visitas, não tiveram um miminho, e muitos quando me vêem chegar mais a minha família já tentam agarrarem para que seja eu a dar-lhes atenção

Infelizmente não me posso desdobrar em 5 ou 6 e sinto-me impotente perante eles.

Margarida
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!