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  • Mãe de fim de semana
    Iniciado por Sandrareginabr
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Sandrareginabr
Mãe de fim de semana

O sol da manhã os iluminava e aquecia. Um calor aconchegante que formigava um lugar em seu ser, mas, onde, ela não podia precisar. Ela apenas absorvia aquela energia, sentindo-se renascida por estar ali, naquele parque, junto àquele que era a fonte de toda a sua vontade de viver. O som harmonioso da brisa e o canto dos pássaros eram perturbados pelo rangido do balanço, um rangido estridente que incomodava os transeuntes, mas ela nem o percebia. Som algum poderia se sobrepor ao riso dele. A cada vai-e-vem do brinquedo ela se deliciava com a satisfação que transbordava nele inteiro, com o riso que escapava não apenas da boquinha dele. O som daquele riso vinha de sua alma inocente e transparecia toda a felicidade garantida pela presença daquela que tornava seu mundo completo.
      Ali, irradiada pela alegria do filho, naquele instante mágico, Maria fez uma prece. Agradeceu à vida pela oportunidade de poder desfrutar aquela raridade: estar com o filho a cada dia, vê-lo crescer, acompanhar todas as fases de seu desenvolvimento como ser humano. Agradeceu por tê-lo junto a si, em segurança. Como é sublime a maternidade! É vivenciar, experimentar em si mesma o grande milagre da vida: gerar vida. Indescritível é a sensação de se ter um ser abrigado na madre, senti-lo mover-se, uma pessoinha autônoma, distinta, uma nova vida, independente e tão dependente daquela que a abriga. Maravilhoso é acompanhar as transformações no próprio corpo à medida que as semanas se passam e seu fruto amadurece até tornar-se perfeito, para, então, sair do ventre diretamente para o colo e o amor incondicional.
      Com um estremecimento de quase desespero colocou-se no lugar de tantas mães que pela dureza dos dias, se vêem obrigadas a estarem ausentes (de corpo, há que se frisar, de alma jamais), enfrentando uma concorrência cruel e desleal, sacrificando-se pelo sonho de oferecer aos filhos uma vida melhor, menos dolorida do que aquela que elas mesmas vivem. Lembrou-se, com horror, do noticiário apresentado naqueles dias. Vários casos de flagrante em que babás, desumanas e ensandecidas, maltratavam, judiavam das crianças, de cujas vidas elas eram pagas para zelar. Maria balançou a cabeça, como se possível, com esse gesto, afastar o pensamento de que poderia ser seu próprio filho, vivendo, não sob seus cuidados e carinho, mas nas mãos uma louca disfarçada, que viesse a machucá-lo de alguma forma. Uma dor lancinante atravessou-lhe a alma, ao pensar na criança indefesa, tão necessitada de sua proteção. E se, porventura, viesse a ocorrer de na hora necessária, não poder estar presente? De repente, ocorreu-lhe que ela não era constituída de deidade. Seus joelhos vacilaram, o ventre se contraiu, tamanha a verdade de sua impotência. Sentiu-se mísera, falha ao perceber que não dependia dela mesma a segurança absoluta daquela criaturinha a quem ela sobretudo amava.
      Concentrou-se no riso do filho, nos olhos que a admiravam enquanto transmitiam aquela felicidade digna dos puros de coração. Com esforço, focalizou sua atenção na realização da sublime tarefa daquele instante: estar com ele, ser mãe. Empurrou o balanço um pouco mais forte, como se o filho pudesse alçar vôo, ter forças sobrenaturais e se colocar além de qualquer perigo. O forte rangido metálico do balanço penetrou-lhe os sentidos, de forma contundente. Um som estridente a cortar o ar, os sonhos. Foi então que acordou. Não era o som do balanço, mas do ônibus tentando se manter em equilíbrio em conseqüência de uma freada imprudente, ao tentar, o motorista, atender ao pedido de parada de um passageiro atrapalhado.
      Maria, de volta à realidade, olhou através da janela e percebeu que o trabalho árduo do dia a fizera dormir pesado, já estava chegando à sua parada. Levantou-se rapidamente e travou uma batalha para chegar à porta de decida, pedindo licença a um passageiro e outro, mal tendo como se segurar no ônibus lotado, carregando sua mochila pesada, carregada de livros, uma muda de roupa, a marmita que a sustentava durante todo o dia e de seu sonho de uma vida melhor. Saiu do ambiente abafado do ônibus para o ar frio da noite. Respirou profundamente, aspirando não apenas ar, mas força para vencer o cansaço depois de uma semana inteira de trabalho intenso e os estudos à noite. Ajeitou a mochila nas costas e apressou o passo. A aula foi interessante, cursar a faculdade não era apenas uma realização própria, mas, principalmente, uma esperança de ter para dar dias melhores. Apressou o passo, não era seguro andar sozinha àquela hora da noite. O ponto de ônibus não ficava exatamente perto de sua casa. Mas ela caminhava feliz, quase corria na verdade, tamanha a vontade de chegar logo, apesar de saber que André estaria dormindo, mas, afinal era sexta-feira, e já antevia o prazer do fim de semana: dois dias inteirinhos com ele!
      Entrou no pequeno cômodo alugado, no escuro, sem fazer barulho, para não acordá-los, mas parece que ele sentiu sua presença. Moveu-se na cama, abriu os olhinhos, e Maria pode ver, através da pouca claridade que vinha de fora, sua boquinha abrir-se num sorriso antes de dizer: mamãe, te amo! Naquele instante não foi ar que ela aspirou, foi uma força imperiosa que restaura e vivifica, algo tão forte e maravilhoso que fez tudo desaparecer, exceto aquele relacionamento perfeito, suas forças se renovaram enquanto ela respirava amor! Ajoelhou-se à cabeceira do filho, beijou seus cabelos, chorando. Que saudade! Tinha grande sentimento de culpa por não poder estar presente todo o dia, às vezes se perguntava se ele compreendia sua ausência, se perguntava, na sua angústia, se seria possível desenvolver o amor por ela, se poderia ter pleno conhecimento de que era sua mãe, e que lutava por ele, trabalhava por ele, estudava por ele. Perguntava-se se ele absorvia sua presença mesmo estando em casa apenas nos fins de semana. Mas ali, naquela madrugada, fez uma prece: obrigada, meu Deus, ele sabe e me ama! Maria permaneceu ao lado da cama, ajoelhada, abraçada ao filho adormecido, chorando, agradecida em sua prece, e desta vez não era um sonho.

Bonito. É autobiográfico? ;)

Abraço


Templa
Templa - Membro nº 708

Sandrareginabr
Sim, querida Templa, como já disse antes, sou poetisa/escritora de meia-tigela. Só sei escrever sobre o que vivencio. Um dia serei como tu que sabes escrever... :-*

anokidas
Lindo Sandra :) os pais hoje em dia sentem uma enorme culpa por não estar tantas horas com as crianças como desejariam.
Acredita que as crianças são muito mais fortes do que pensamos, e se formos felizes elas serão felizes,porque não há melhor médium sensitivo que capte mais as energias do que elas. :)

Beijos

Citação de: Sandrareginabr em 15 outubro, 2012, 22:39
Sim, querida Templa, como já disse antes, sou poetisa/escritora de meia-tigela. Só sei escrever sobre o que vivencio. Um dia serei como tu que sabes escrever... :-*

Ó querida, os melhores escritos são sempre esses, os das vivências verdadeiras, que raramente têm lacunas, como a ficção pura. Aliás,  eu não acredito muito na ficção a 100%.

Abraço

Templa
Templa - Membro nº 708

Sandrareginabr
Citação de: anokidas em 15 outubro, 2012, 22:44
Lindo Sandra :) os pais hoje em dia sentem uma enorme culpa por não estar tantas horas com as crianças como desejariam.
Acredita que as crianças são muito mais fortes do que pensamos, e se formos felizes elas serão felizes,porque não há melhor médium sensitivo que capte mais as energias do que elas. :)

Beijos

Grata pelo apoio, querida Anokidas, mas te digo que hoje a vida já está mais calma... já fico mais tempo com o filhote e não sofro sua falta.

Citação de: Templa em 15 outubro, 2012, 22:46
Ó querida, os melhores escritos são sempre esses, os das vivências verdadeiras, que raramente têm lacunas, como a ficção pura. Aliás,  eu não acredito muito na ficção a 100%.

Abraço
Templa
Grata  :-*

anokidas
Não tens que agradecer querida Sandra sei do que falo pois a minha área é essa mesmo  :)
Para além de ser mãe e educadora posso dizer que também sou uma mãe galinha mas tipo pavoa ;D