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  • O Taoismo e a Imortalidade
    Iniciado por AndreiaLi
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AndreiaLi
O Taoísmo e a Imortalidade

Imortalidade é o termo pelo qual os taoístas em cada nível de entendimento designam sua meta. Daí o título de imortal conferido aos sábios, mestres de ioga e mesmo antigos reclusos, aos quais, em virtude de seu saber, se atribui a conquista do objetivo. Imortal é aquele que fazendo valer ao máximo seus poderes físicos e mentais, calando a paixão e banindo o menor desejo, atingiu a existência livre e espontânea – um ser tão próximo da perfeição que seu corpo não passa de abrigo ou receptáculo para o puro espírito.

O Tao é incognoscível, vasto, eterno. Em seu aspecto não-diferenciado, é visto como um fluxo infindável, e todas as coisas se acham sujeitas à mutação a cada instante; não obstante, as mudanças se fazem em ciclos regulares, enquanto cada esquema se repete ao infinito. Tais ciclos são previsíveis, como por exemplo, a alternância do dia e da noite e as quatro estações.

Os taoistas aprendem a contemplar e a investigar as várias sequências de mutação; e a contemplação engendra a tranquilidade que sobrevém quando a perda, a decadência e a morte são reconhecidas como não menos essenciais ao todo que o ganho, a ascensão e a vida. Segundo ensinou Lao Tsé, é melhor confiar as coisas ao Tao, sem intervir em seu curso natural.

Se há uma palavra que tem predominância no taoísmo é: serenidade. Um taoísta dedicado é aquele que procura viver o mais possível em harmonia com a natureza. Quando se toma a natureza por guia, o viver se torna fácil, calmo, alegre, as preocupações se vão, a serenidade se instala.

Um dos maiores estudiosos ocidentais do taoísmo, John Blofeld, define alguns dos princípios que norteiam a acção do taoísta: Wu wei, princípio cardeal dos taoístas, literalmente quer dizer não-acção, mas não no sentido de postar-se inerme como um tronco ou uma pedra; significa antes evitar acções que não sejam espontâneas, actuar plena e intensamente apenas naquilo que constitui a necessidade presente, estar alerta sem fadiga e calcular cada ato em função de um bom motivo.

Lendas dos Imortais

O taoísmo é repleto de histórias curiosas, de carácter diferente, mas todas referentes aos imortais. Uma das inúmeras histórias recolhidas por Blofeld, é conhecida como A lição da névoa branca e conta o seguinte:

No reinado do Imperador Shen Tsung (1573-1620), um estudioso chamado Fan, nativo de I Ping, distinguiu-se de tal modo nos exames públicos, que recebeu uma série de cargos de importância em diversas regiões do império.
Aonde quer que fosse deparava com os males da sociedade: cupidez, avareza, luxúria, vaidade, crueldade e opressão. De licença em sua terra natal quando da morte do pai, resolveu não mais voltar à vida oficial e retirar-se para as montanhas, em busca do Caminho.

Nas vizinhanças do monte Omei, adquiriu uma pequena cabana onde, em meio aos rigores do inverno, se dedicou a seus livros e pôs-se a meditar diariamente. Um regato próximo abastecia-o de água pura; para alimento comprara uns poucos sacos de arroz e uma ou duas jarras de óleo, parcos recursos a que acrescentou os produtos da floresta: cogumelos, brotos de bambu e inúmeras plantas suculentas e saborosas. Nos dias amenos, erguia-se para contemplar o panorama de nuvens flutuantes, tintas de coral e bordejadas de ouro, pondo-se depois a vaguear pelos cumes e vales à cata de ervas medicinais e petiscos para a mesa; não raro dormia à luz das estrelas.

Depois de três anos, seu coração já estava em sintonia com os mistérios comuns da natureza; mas o Tao, este lhe escapava. Sei que ele está aqui. Percebo suas transformações, suas dádivas e suas requisições; mas, velado e esquivo, como segurá-lo?
Embora conhecido dos poucos vizinhos como hábil curandeiro e consumado imortal, tinha-se na conta de um andarilho que desertara do mundo de pó.

Um dia, recebeu um visitante que, embora toscamente trajado como camponês, revelava o aspecto sábio e juvenil de um verdadeiro imortal. Abrindo um jarro de vinho que não tocara desde a chegada, Fan ouvia com veneração seu hóspede.

Disse este: Tenho a honra de ser seu vizinho mais próximo na qualidade de génio do regato que corre em frente à sua distinta morada. Posso perguntar por que um estudioso tão conspícuo falhou em encontrar o ponto de partida do Caminho, especialmente quando ele está bem diante de seu nariz?
Depois, tocado pela confusão de Fan e querendo deixá-lo à vontade, o gênio acrescentou: Esse é um indício de sua sabida inteligência, senhor. Há quantidade de reclusos que se persuadem de ter encontrado o Caminho sem nada para justificar tal pretensão. Não o procure nas nuvens brilhantes da aurora e do crepúsculo, nem na claridade do céu outonal. Busque-o na neblina que flutua pelos vales aos quais, até hoje, sequer condescendeu em lançar um olhar. Dito isto, o génio fez uma polida reverência e se retirou.

Daí por diante nosso estudioso passaria os dias sentado numa pedra, contemplando, lá embaixo, a branca névoa que flutua pelos vales. Nenhuma iluminação espiritual aconteceu, mas ele persistiu. Três anos se passaram. Os lenhadores das cercanias, vendo-o estático como uma rocha, horas a fio, davam graças aos céus por terem enviado um imortal para habitar entre eles. O bom tempo era atribuído a ele e à sua virtude; o mau tempo, sussurrava-se, poderia ser pior sem ele. Veio então o dia em que Fan se adiantou  cheio de júbilo para onde o regato borbulhava escapando de uma gruta e invocou o génio, que surgiu envolto em brocados sobre fina seda.

Não precisa contar-me!, estrondeou o génio numa voz poderosa. Você encontrou o Caminho. Posso perguntar como?
Ah, ah, ah, riu Fan. Por que não disse antes? Não encontrei o Caminho; apenas, de repente, dei-me conta de que nunca o perdera. As nuvens carmesins, o sol acre do meio-dia, a marcha das estações, as fases da lua – nada disso são funções majestáticas ou símbolos auspiciosos do que subjaz além. Tudo isso é o Tao. Nascer, respirar, comer, beber, andar, sentar, acordar, dormir, viver, morrer – fazer isso é palmilhar o Caminho.

Quando se sabe acatar os factos sem preocupações de gozo e de tristeza, vestir este ou aquele manto conforme a necessidade, recolher pinhões ou cogumelos não para o paladar, mas para a fome, dar apenas os passos necessários, acolher as coisas como elas são – Então se conquistou o Caminho, nascendo-se para a imortalidade. Gastar anos em busca do que nunca se perdeu é de facto uma pilhéria.
A gruta diante da qual se postavam ecoava com seu riso sacudido. O génio então se recompôs. Os brocados e fitas de sua roupa bailavam ao vento, pendeu a cabeça nove vezes, como em reverência a um imperador, e gritou, alegremente: Eis que enfim encontro meu mestre!

fonte:O Taoísmo e a Imortalidade: Elizabeth Calcavante

A gruta diante da qual se postavam ecoava com seu riso sacudido. O gênio então se recompôs. Os brocados e fitas de sua roupa bailavam ao vento, pendeu a cabeça nove vezes, como em reverência a um imperador, e gritou, alegremente: Eis que enfim encontro meu mestre!