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  • Emanuel o Meu Conto de Natal!
    Iniciado por Margarida
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Este conto de Natal foi um sonho de adolescente que jamais esqueci.
Atrevi-me ainda na adolescência a escreve-lo mas, como era muito miúda, apenas o fiz para mim mesma e sem lhe dar grande importância.
Durante anos ficou ali escondido numa gaveta, abandonado, a mercê dos bichos do papel, tendo infelizmente um fim ainda mais trágico.
Com uma mudança de vida e de casa, muito papel foi rasgado, inutilizado e deitado fora.
Quando me desafiaram a escrever um conto de Natal, lembrei-me com muita nostalgia do que tinha escrito em novinha e tinha uma vaga ideia como me tinha dado tanto prazer em escreve-lo e como o achei tão bonito. Mas não existia mais... Apeteceu-me chorar...
Mas o desafio estava lançado e tinha de fazer um conto, por isso pus mãos á obra, debrucei-me sobre o papel, peguei numa caneta e deixei a mão escrever, páginas e páginas sem parar, como que por magia, a mão deslizava sem parar.
Chegando ao fim, comecei a ler com calma tudo o que havia escrito, era realmente muito estranho, pois lembro-me de o escrever mas sem ter a noção da história em si, e para grande espanto meu, ao ler e reler, descobri, que não era nada mais nada menos que o conto que tinha escrito em nova.
Tinha voltado tudo á memória, todos os pormenores, o tempo não tinha alterado nada e a história mantinha-se actualizada.
É como muito carinho que a partilho e a dou a conhecer, tendo como esperança que a minha mensagem seja absorvida, pois nos dias que correm, o Natal não tem quase o significado de milagre que deveria ter e passou a ser mais uma época consumista.
É bom parar um pouco, ler um livro e recordar que o Natal deveria ser uma época solene, de Paz e muito amor.
Eu sonhei, ainda sonho com um mundo melhor, e acredito que num futuro mais próximo, o Natal venha a ter o significado inicial.
É com essa esperança que vos deixo aqui, Emanuel O MEU CONTO DE NATAL!



EMANUEL O MEU CONTO DE NATAL!


Era inverno, estava frio, tão frio que ate os próprios ossos pareciam congelar, mas todas as pessoas que passavam traziam risos e sorrisos com toda a alegria que a época do natal nos proporciona.
As ruas estavam enfeitadas, iluminadas com luzinhas de várias cores que faziam as delícias principalmente das crianças que as olhavam com as suas carinhas de espanto ao mesmo tempo que maravilhadas.
No entanto havia alguém a quem tudo aquilo passava despercebido.
Ela estava triste! Só! Perdida no tempo!
Pobre Sofia!
A sua vida era um vazio completo, limitava-se apenas a viver um dia seguido de um outro, como uma máquina, como um robot...
Saía de manhã para o emprego e só voltava a casa tarde da noite, pois findo o horário profissional vagueava pelas ruas como uma alma penada, para enganar a solidão que a maltratava ainda mais quando esta mulher amargurada ficava em casa, metida entre quatro paredes, como se estivesse em prisão domiciliária.
Mais uma noite passara e de novo voltava ao mesmo de sempre, ao escritório...
Escritório onde ela passava despercebida e, onde agora os colegas em vez de discutirem os assuntos das tramóias e enredos das telenovelas, mudavam de tema para a época actual e onde toda a gente se perde no tempo... O Natal!
Faziam contas á vida folheando catálogos com brinquedos, para as suas crianças, os filhos, os sobrinhos, os priminhos, enfim para todos os que tivessem tenras idades e que ainda vivem no mundo da fantasia e da brincadeira. Depois vinham as outras preocupações...
As prendas para as "caras metades", para as "ricas sogrinhas", as mamãs, as tias, as primas, não esquecendo também os homens pertencentes ao resto da família.
Enfim... Nada que um bom perfume, ou uma boa colónia, eau de toilette ou até mesmo after shave, não resolvesse a questão, pois o tempo era pouco para achar outro tipo de presente. Além disso perfume, é sempre perfume! Qualquer mulher ou homem que se preze, rende-se sempre a este tipo de prenda, mesmo que não seja o seu preferido, mas o que conta é a lembrança. A intenção...
Mas Sofia não tinha ninguém que se lembrasse dela, já não tinha família fazia tempo e nunca casara, o amor nunca lhe tinha batido á porta.
Às vezes as lágrimas caíam sem que ninguém desse por isso, por ver todos naquela azáfama de compras, de presentes com papeis coloridos, laços extravagantes. Carregados até não poderem agarrar em mais sacos, esbarrando aqui e ali.
Mas porque tinha ela, Sofia de viver assim, naquela escuridão? Porque não podia ela viver toda aquela agitação Natalícia Não era uma pessoa má para pensar que seria castigo de Deus e como tal ter de passar por todo aquele inferno de vazios, desprezo e profunda solidão.
Estava na altura certa para mudar, mesmo que temporariamente a sua atitude, é que já estava nas vésperas de Natal, só faltavam dois dias.
De repente vindo do nada deu-se conta o quanto estava atrasada e havia tanto por fazer. Será que iria ter tempo?
Este era o ano da sua vida, poderia continuar sozinha mas de certo iria enfrentar a vida com outros olhos, se bem que nem sabia por onde começar. Mas mais uma vez fez-se luz no seu espírito.
Iria começar por si mesma, tratar de si, mudar de estilo pois "aquelas roupas negras" que sempre usava em nada a ajudavam e muito menos levantava o seu ânimo. Estava decidida! Iria pedir duas horas ao chefe, pois nunca tinha pedido nada, nem faltado desde o dia em que entrara para aquele escritório.
Mal sabia ela, que tal decisão iria causar murmurinhos entre colegas. Menos mal!
Para quem entrava ali e parecia invisível a todos, começava já ali, naquele momento a sua metamorfose.
Claro, que foi exactamente o que aconteceu, mal saiu do gabinete do chefe e vestiu o casaco, quem se encontrava ao redor, parou por instantes, deixaram cair o queixo de espanto, entre olharam-se e mal ela saiu, a bisbilhotice começou, todos tinham opinião a dar, todos queriam saber o que se passava com Sofia.
No fundo estavam todos curiosos em saber o que acontecera... Ai! Como a curiosidade matava... Que ânsia repentina de bons cuscos, para meterem o nariz na vida de quem até ali, pura e simplesmente ignoravam e desprezavam.
Sofia saía com um sorriso nos lábios, afinal de contas era alguém, só precisava acordar e sair daquele pesadelo silencioso que era a sua vida até ali.
Agora não podia voltar atrás, nem queria, só por aquele pequeno bocadinho o seu ego elevara-se e não pretendia voltar a cair na escuridão em que sempre vivera.
Mesmo no prédio ao lado do escritório existia um pronto-a-vestir fino onde nunca tinha entrado. Parou em frente á porta, respirou fundo e entrou com o pé direito.
A empregada que se dirigiu a ela era uma rapariga nova, muito bonita e inspirou em Sofia muita confiança, pôs a par da situação a empregada do pronto-a-vestir que ficou radiante em saber que dinheiro não seria problema e que a sua cliente estava disposta a mudar todo o seu guarda-roupa, apenas precisava de ajuda para uma mudança drástica na sua aparência.
Como se divertia a vestir e despir todas aquelas roupas, e como se sentia diferente, para melhor! Olhava-se ao espelho com todas aquelas roupas novas e nem queria acreditar no que via, que mulher bonita estava ali á sua frente, quando na realidade era ela mesma, e o espelho não era mágico!
Porque é que ela não tinha já feito isto? Ai o tempo que perdeu...
Mas não importava, agora era o momento, dali para a frente seria uma vida nova.
Depois de pagar a despesa olhou para os sacos e pensou: - Jesus... como é que vou levar tudo isto?
Estava tão feliz que nem se incomodou, apenas pediu para lhe guardarem as suas coisas por uma ou duas horas.
Tinha de fazer algo mais, e ia aceitar a sugestão da rapariga do pronto-a-vestir. Ia ao cabeleireiro!
Á saída da loja encontrava-se um pedinte, barbudo, esfarrapado, que lhe pediu uma esmola.
Sofia espantou-se com os modos do homem... Era relativamente novo e o modo como a abordou deixou-a perplexa, era educado, de tom meigo, como era possível?
Que teria acontecido na vida daquela alma para chegar aquele ponto?
Sofia abre a carteira, pega numa nota e dá ao mendigo perguntando-lhe de seguida se tinha fome.
Mais uma vez o pobre consegue deixa-la de boca aberta ao dizer-lhe que agradecia mas sabia que ela nesse dia não tinha tempo a perder. Que provavelmente se veriam outras vezes e assim, pegou na mão dela, beijou-a, voltou costas e desapareceu no meio da multidão apressada. Que estranho...
Mas era verdade, não podia perder tempo, o facto é que tinha pedido apenas duas horas e o tempo corria. Se calhar até precisaria da sua hora de almoço, mas que diferença iria fazer?
Agora era a hora, nada de olhar para trás, seria tarde demais para desistir, por isso olhando para o outro lado da rua, disse para ela própria: - 0.k. Sofia, não há tempo a perder, toca a seguir o teu caminho... Coragem!!!
E assim foi. Atravessou a estrada e entrou no cabeleireiro sem hesitar, uma cabeleireira perguntou-lhe o que gostaria de fazer, ao que ela respondeu: - Entrego-me nas suas mãos...
Quero mudar a minha figura, mas não tenho experiência alguma a esse respeito.
Sempre usei o meu cabelo assim, por isso vou confiar em si, faça o que achar melhor para mim!
Depois de algumas trocas de ideias, sugestões e até algumas dúvidas, estava pronta para este novo desafio...
Ia lendo revistas, coisa que nunca fazia, não se interessava por todas as "fofocas", fotografias, não ligava aos que se diziam famosos, nada disso a interessava, mas sem saber porquê, ou porque razão, estava a gostar e sentia algum prazer em ler semelhantes revistas.
De vez em quando olhava em seu redor para ver o comportamento das outras mulheres. O que faziam, como se vestiam, do que falavam se olhavam para ela, enfim ainda existia lá bem no fundo um pouquinho de insegurança.
No entanto com toda aquela vontade de fazer algo diferente na vida, logo apagou todos os temores que volta e meia lhe invadiam a mente.
Com tudo isto, com toda a turbulência de pensamentos que lhe invadiam a cabeça não se deu conta que já estava pronta...
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

A cabeleireira interrompeu os seus pensamentos ao dizer-lhe: - Minha querida, espero que goste, fiz o melhor que pude, espero que seja do seu agrado.
Sofia atreveu-se a olhar o espelho e nem queria acreditar, ficou sem palavras.
As lágrimas queriam sair mas conseguiu controlar-se, mas não acreditava no que via, mas que Deusa era aquela ali bem á sua frente? Não podia ser ela... Mas era!
Mal conseguia andar sem olhar para todos os espelhos para ter a certeza que era mesmo ela e não uma miragem enganosa.
Pagou o que devia pelo serviço maravilhoso que tinham feito com ela e saiu para a rua com ar triunfante.
Agora era a hora da verdade, tinha de regressar ao escritório e enfrentar os comentários dos colegas. Mas antes tinha de ir buscar as suas roupas novas, por falar nisso, porque não estriar já algumas?
E assim foi, até as empregadas do pronto-a-vestir estavam embasbacadas, como era possível ter entrado ali de manhã um patinho muito feio, desajeitado, trapalhão e na hora do almoço se ter transformado numa Deusa Grega?
Ai ai ou se despachava ou ia chegar atrasada pois só tinha dez minutos e ainda não almoçara.
Não fazia diferença toda a diversão e satisfação que tivera, eram alimento suficiente, pelo menos para a alma... Mas não havia problema, em frente ao escritório havia um quiosque com pacotes de bolachinhas, queques, sumos, não perderia muito tempo em comprar algo de género e comer depois á socapa no escritório.
Bom... Que mudança! Até já estava mais atrevida.
Não pensou duas vezes e comprou umas coisitas para trincar, um sumo e para sua própria surpresa comprou no quiosque ao lado um vaso com uma flor!
Mas desde quando é que ela gostava de flores? Pelo que se lembrava achava que eram um desperdício, que murchavam e iam parar sempre ao mesmo sítio... O lixo.
Mas não ia acontecer com aquela planta, ela iria cuidar dela. Cuidar dela? Jamais tinha cuidado de flores, e agora?
Nada de pânico, era mais um desafio que enfrentava e estava deliciada.
Finalmente estava a caminho e ia ter a prova final, ao entrar cinco minutos atrasada já os colegas comentavam o facto, e mesmo quando entrou, não a reconheceram.
Um dos seus colegas levantou-se, dirigiu-se a ela e perguntou-lhe o que desejava ali, em que podia ajudar a uma senhora tão bonita...
Sofia não se conteve e lançou uma longa e sonora gargalhada.
Dirigiu-se à sua secretária, tentou arranjar espaço para todos os seus sacos e encaminhou-se até à casa de banho. Tinha de se olhar ao espelho mais uma vez.
Uma vez lá dentro dá de caras com a esposa do seu chefe a retocar a maquilhagem.
-   Boa tarde D. Graça. – Cumprimenta-a Sofia.
-   Boa tarde. – Responde D. Graça. – Não estou a conhece-la, é nova aqui?
Sofia esboçou um largo sorriso e responde com ar de gozona:
-   Sou eu a Sofia! Já não se lembra de mim? Sou assim tão insignificante?
-   Sofiaaaaaaa... Ena que mudança, parabéns minha querida! – Diz D. Graça boquiaberta, espantada com a tremenda mudança em Sofia. - Estou tão satisfeita de a ver assim tão renovada, nem parece a mesma, está linda, quem é que podia adivinhar que ai estava uma mulher tão bonita... – Continua D. Graça.
E riram-se as duas.
-   Sofia cuide-se, não volte aquela aparência que metia dó. Vai ver como com esta mudança muitas coisas boas iram ainda aparecer na sua vida. – Aconselha D. Graça.
De repente olha para Sofia e diz-lhe mais uma vez...
-   Posso sugerir algo filha?
-   Claro que sim D. Graça, todas as suas sugestões são bem-vindas e vindas de si uma senhora de tão bom gosto, é quase uma ordem. - Responde Sofia.
-   Ora minha filha, sou igual a toda a gente... Mas posso dar um pouco de cor ao seu rosto? – Pergunta D. Graça.
-   D. Graça, ai meu Deus tanta coisa nova de uma só vez, será que aguento? - Diz Sofia meio atrapalhada...
-   Sofia, não seja tonta minha querida, venha cá! - Ordena D. Graça.
D. Graça era já uma senhora com bastante idade, com muita experiência de vida e sempre olhava para Sofia com vontade de a abanar, de a fazer acordar para a vida real, mas nunca tinha tido coragem de o fazer. Mas já que a empregada tinha dado o primeiro passo, agora já podia ajuda-la como sempre desejara.
Por isso pôs mãos á obra, pediu a Sofia que se sentasse na cadeira junto aos lavatórios e começou a sua obra de arte, a sua boa acção se é que assim lhe poderia chamar.
Nada que um pouco de rouge, uma corzinha nos olhos, um bom rímel, e um eye linner não pusesse um morto vivo parecer um ser com um ar saudável e vivinho da Silva.
Se bem que não era o caso, mas com aquele tratamento, ninguém conseguiria deixar de se render aos encantos daquela nova mulher.
Agora sim, não faltava mais nada, estava completamente diferente.
D. Graça quis ficar na casa de banho com a porta entre aberta para ver o efeito que Sofia iria causar nos colegas.
Com ar triunfante a nossa Sofia atravessou o escritório de nariz levantado, senhora de si mesma, confiante, apercebendo-se do bichanar dos colegas.
Tinha sido um dia em cheio, o trabalho estava um pouco atrasado, por isso tinha agora de se concentrar nos arquivos e nos novos documentos que tinha de analisar.
Já a meio da tarde, na hora do lanche, surpreendeu-se ao ser abordada por dois colegas que a convidavam para ir até ao bar beber um café na sua companhia.
Que estranho, nem uma só vez o tinham feito desde que começou a trabalhar naquela empresa. Ela sabia porquê, mas a alegria dos colegas seria sol de pouca dura...
O seu chefe abre a porta do seu gabinete e chama-a deixando o resto do pessoal perplexo, a pensarem mil e um disparates. Em voz alta ele diz: - Sofia... Chega aqui! Larga tudo o que estiveres a fazer e vem aqui! É uma ordem!
Coitada pensava já que tinha feito algo de errado, iria levar uma repreenda, ou sabe-se lá o que poderia acontecer...
-   Muito bem minha menina... Estás convocada por min e pela D. Graça a ires beber um chá connosco Continua o chefe, observando a cara de espanto de todos os outros empregados.
Ufa que alivio, por momentos parecia que o mundo ia desabar nos seus ombros, mas o que era certo, é que estava arrependida por não ter tido aquela atitude de renovação há mais tempo. O único senão era ver os colegas a roerem-se de inveja e a olharem-na já com ar de quem iriam aprontar alguma para acabar com a sua alegria. Não importava... Iria vence-los! Agora nada a parava... Eles que se atrevessem, que ela estaria preparada para a batalha. Não perdiam por esperar.
Finalmente o dia estava a terminar. Estava cansada e hoje não sentia vontade de andar a vaguear pela rua para fazer tempo e ir para casa. Tinha sido um dia em pleno, e já há algum tempo desejava por tudo chegar a casa, tomar uma refeição leve e dormir...
Não restam dúvidas foi isso mesmo que aconteceu, mal caiu na cama adormeceu exausta, mas muito feliz.
Quando acordou no dia seguinte, olhou-se no espelho e sorriu, não era um sonho, era a pura realidade, só tinha de manter aquela vontade, alegria de viver, respirar fundo e enfrentar a vida de braços abertos. Além disso agora só faltava um dia para o Natal, ainda tinha muito a fazer.
Depois do trabalho iria às compras, ao supermercado.
Como era engraçado pensar em tal, pois habituou-se a comer sempre fora de casa e repentinamente estava disposta a preparar uma Ceia de Natal. Nada de especial, pois apesar de toda aquela mudança continuava sozinha, mas isso já não era um fardo, tomou gosto pela vida e cada coisa a seu tempo, afinal de contas começava a nascer também uma esperança de, quem sabe ainda encontraria alguém para caminhar com ela o resto do caminho da sua vida.
O seu entusiasmo não tinha limites, o dia correu às mil maravilhas, o trabalho já estava em dia, em ordem, não se cansava de ouvir piropos dos colegas, enquanto as colegas se roíam de inveja, fazendo com que ela se sentisse uma rainha, poderosa, que bom era viver!
Quando saiu depois de mais um dia de trabalho, chovia e estava tanto frio que até os dentes se arrepiavam, no entanto parecia não sentir frio, o seu casaco novo era um autêntico cobertor, não havia gelo que entrasse.
Ao sair encontrou no chão, tremendo de frio, o pobre que tinha conhecido no dia anterior.
Perguntou-lhe se precisava de tecto, ou de uma bebida quente. O homem sorriu e apenas disse: - Só precisava de um casaco quente, nada mais menina...
Mas que coisa, ela não acreditava nem no que via, nem no que ouvia, como é que alguém tão sem nada se limitava a pedir tão pouco? Sem quase se dar conta despiu o seu casaco e colocou-o sobre os ombros do pedinte.
-   Vem anda, vamos tomar uma coisa quente. – Diz-lhe Sofia.
- Muito obrigado, mas o que acabou de fazer, já me confortou o corpo e a alma, muito obrigado. – Responde-lhe o mendigo.
Ela nem acreditava... Como era possível? Que coisa...
Enquanto pensava naquele episódio o pobre tinha desaparecido da sua vista quase que por magia. Acreditava sim que ainda o veria por uma outra altura e estaria sempre disposta a ajuda-lo, sentia um grande carinho por ele, sem saber porquê. Era carinho sim, nada tinha a ver com pena. Desejava ardentemente que a vida proporcionasse uma outra oportunidade para aquele ser humano.
Esquecendo o assunto pôs-se a caminho do supermercado onde uma nova experiência ia ter. Como era engraçado andar com o carrinho de um lado para o outro...
O tempo corria sem dar conta, parecia uma criança a fazer traquinices, só por vergonha é que não se pendurava no carrinho das compras e fazia um rally pelos corredores.
Nunca se tinha dado conta como era divertido fazer compras daquela natureza. Nem mesmo as longas filas para as caixas de pagamento pareciam enfadonhas, pelo menos para ela. Como via tudo com outros olhos...
Como parecia engraçado ver toda aquela gente com cara de enjoados, apanhando um grande frete, olhando desesperadamente para os relógios, suspirando, enfim. Parecia maldade mas ela divertia-se só de olhar para eles naquele tédio.
Quando olhou para o seu carro, observou que ia gastar uma pequena fortuna, mas o que importava? Estava tão entusiasmada...
Valia a pena, nada conseguia tirar aquela alegria que sentia, o ânimo, parecia que era a primeira vez que estava a viver tudo aquilo.
Finalmente já estava despachada, agora era só carregar com todas as compras até casa.
Não sabia porquê mas só pensava no pedinte. Onde andaria? Teria fome? Frio? Teria algum tecto para se abrigar? Porque é que não lhe saía da cabeça a sua imagem?
Enfim, nem deu que já estava á porta de casa.
Mais um dia passado e não viu a hora de cair na cama e dormir. Só tinha de arrumar as coisas do supermercado e já podia descansar.
Tinha de acordar cedo no dia seguinte para preparar tudo, até a decoração.
Incrível, a sua casa nunca tinha tido uma árvore de Natal.
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

Mal caiu na cama os olhos fecharam-se e o tempo parou, ou pelo menos assim pareceu pois o "João Pestana" tinha chegado sem pedir licença.
Estava tudo calmo quando a campainha tocou. Mas o que era aquilo? Quem é que lhe batia á porta na véspera de Natal e ainda por cima às sete e quinze da manhã? Vestiu o roupão e ainda ensonada perguntou quem era...
-   Sou eu D. Sofia...
Ela espreitou com a porta entreaberta, e que coisa boa...  Era o pedinte. Mas como é que ele sabia a sua morada? Andava a segui-la? Seria um tarado? E como sabia o nome dela? Por momentos sentiu um calafrio...
-   Sou eu, venho devolver-lhe o seu casaco. – Diz-lhe o pedinte.
-   O quê? Mas você não tem frio? Fique com ele... – Diz ela com um tom amigo.
-   Não há necessidade menina. Você tem um coração puro, é generosa, uma boa alma. – Diz-lhe o mendigo.
-   Escute uma coisa, tem onde ficar? Onde vai passar o Natal? Em algum abrigo? – Pergunta-lhe Sofia.
-   Não se preocupe menina, já estou acostumado ao banco de jardim, às estrelas e a Deus Nosso Senhor. – Responde-lhe ele.
-   Estou sozinha, sem ninguém, aceita passar o Natal comigo? Não prometo nada, mas pelo menos não estaria ao relento, com frio, com fome. – Diz ela.
-   Menina seria um abuso meu, além disso a Sofia deveria ter mais cuidado, não deve convidar estranhos para dentro de sua casa. – Diz-lhe o mendigo em tom paternal.
-   Eu sei, mas não sei porquê o meu coração diz-me que você veio em Paz, por isso e se fui eu quem o convidei, não é abuso. – Diz ela sorrindo.
-   Menina gostaria muito mas tenho receio que se arrependa ou que eu não mereça tanta bondade. – Comenta o pedinte envergonhado.
-   Vá, eu não lhe faço mal, entre! – Diz Sofia com voz mandona. E assim foi, ele entrou e a medo fez um pedido:
-   Seria pedir muito, poder tomar um banho?
Sofia sorriu. - Claro que pode, esteja á vontade, até lhe digo mais, ainda guardo algumas roupas de meu pai, de certeza que lhe vão servir... Entretanto vou preparar a sala. – Comenta Sofia.
-   Obrigado, depois a ajudarei, prometo. – Diz o pobre homem agora com um sorriso lindo.
Sofia estava radiante, tinha companhia, não importava mais quem era ou se corria algum risco, o que lhe importava mais era que não estava só, pelo menos naquele dia.
Abriu a mesa da sala, colocou uma linda toalha bordada com anjos. Tirou o seu serviço de jantar com azevinhos pintados e começou a pôr os seus acepipes, aperitivos, salgadinhos e doces, enfim um pouco de tudo.
Eram as nozes, as avelãs, os pinhões, cajus, amêndoas, sultanas, os rissóis, croquetes, pasteis de bacalhau, os sonhos, as filhoses, o bolo-rei, arroz doce, enfim uma montanha de iguarias. Lá mais para a frente iria cozer o bacalhau, o grão e as couves para o almoço.
Entretanto o seu convidado saía da casa de banho, limpo, vestido com outras roupas, penteado e até tinha aparado a barba. Parecia outra pessoa!
Tinha um rosto lindo e Sofia sentiu uma sensação de "dejá vu", tinha a certeza que já conhecia aquela pessoa de algum lado. Mas não ia matar a cabeça com isso, tinha sim que fazer e como tal o estranho lhe tinha dito, ia ajuda-la na decoração da sala.
-   Aqui estou menina! Pronto para a ajudar. – Diz-lhe o mendigo.
- Que bom... Estranho, sabe o meu nome mas eu não sei o seu... – Observa Sofia
-   O meu nome é Emanuel. – Responde-lhe ele.
- Bonito nome...
     Agora vou pedir para me ajudar, pode ser? – Pergunta ela.
-   É claro que sim, será um prazer. Responde-lhe Emanuel.
-   Vamos decorar o pinheirinho, mas tem de o trazer para aqui, é pesado e eu não sou assim tão forte, tiveram de mo trazer a casa. – Desabafa Sofia.
-   Eu vi, e o que vai pôr no pinheirinho? – Pergunta o pedinte.
-   Vou enfeitar com pinhas coloridas, sininhos, anjos, velinhas e no cimo uma estrela cintilante. – Responde-lhe Sofia
-   E só tem isso para a decoração? - Pergunta ele com um ar tristonho.
-   Claro que não, falta o mais importante... O Presépio! – Diz Sofia com ar solene.
Emanuel esboça um sorriso de grande alegria, o que deixa Sofia intrigada. Porque é que ele tinha ficado tão feliz por causa do Presépio? Que ser tão enigmático!
E assim foi, depois do pinheiro montado e decorado, junto a este no chão, forrado a musgo, montaram os dois, o Presépio com as figuras principais.
O anjo, a Nossa Senhora, São José, o Menino nas palhinhas, os animais e os três Reis Magos. Que bonito que estava!
Emanuel olhou para Sofia envergonhado e pergunta-lhe:
-   Sofia sabe rezar?
-   Sim sei, sou católica, não vou muito á igreja, mas tenho a minha maneira de estar com Deus. Porquê? – Pergunta Sofia intrigada.
-   Senti vontade de dizer uma oração e ficaria com o meu coração cheio de felicidade se a menina me acompanhasse. – Responde-lhe ele com ar de emoção.
-   Com uma condição, teremos de começar com a minha oração preferida! – Diz ela na expectativa que ele concorde.
-   E qual é? – Pergunta o humilde homem.
-   A oração que Jesus nos ensinou! – Diz ela envergonhada.
-   Pai-nosso que estais no Céu, - Começa ele.
-   Santificado seja o vosso nome... – Continua ela.
E assim continuaram juntos naquele momento mágico, não escondendo Emanuel uma lágrima que lhe escorre pelo rosto.
Como o tempo tinha passado a correr... Já estava na hora do almoço...
Quando Emanuel viu a mesa posta, exclamou:
-   Que banquete! Sofia eu não sou digno...
-   Como? Interrompe-o ela. Por favor, estou muito feliz, partilhe comigo este momento!
-   Desculpe mas... - Responde ele.
-   Mas nada, sente-se! Vamos comer! Faremos uma oração em silêncio, pode ser? – Pergunta Sofia.
-   Com muito gosto. – Responde-lhe ele.
Depois de levarem pelo menos duas horas á mesa deliciando-se com um pouco de tudo, levantam-se e sentam-se no sofá ouvindo um CD de "Shubhert" com a maravilhosa "Avé Maria".
Sofia, então quebra um pouco o silêncio e pergunta:
-   Desculpe a curiosidade, mas que volta deu a sua vida para acabar na rua?
- Eu era Sacerdote, cumpri sempre a "Sua Palavra", mas revoltei-me com certas hipocrisias da Igreja, sem saber como, por ordens superiores na hierarquia, fiquei no lado de fora. Sem família, sem nada, aceitei o castigo, mas nunca deixei de acreditar... E assim começou a minha cruz. – Explica ele.
-   Compreendo, também não tenho família, mas porque não arranjou emprego? Um lugar modesto que fosse para pernoitar? – Pergunta Sofia.
-   É bom de falar! Sou órfão, nunca tive nada de meu, quando me tornei padre a paróquia era a minha casa, não tinha para onde ir, a tristeza não me deixou raciocinar e quando tentei arranjar emprego, já não tinha apresentação. – Continua ele a explicar.
-   Mas o que aconteceu de tão grave para o porem nessa situação? – Pergunta Sofia espantada.
-   Jesus era um homem simples, humilde, envergando uma simples túnica, espalhando a palavra de seu Pai, de Paz, amor e justiça entre os homens, reprovava a ostentação e a falsidade. Sempre disse que éramos todos iguais, que a vaidade, as ostentações e a falsidade era tudo condenável.
- Sim é verdade. – Interrompe-o Sofia. – Mas em que é que isso o levou á sua situação?
-   Ora respeitando todos estes ensinamentos, desrespeitei os meus superiores, não obedecendo a certos rituais, a vestir certas vestes ricas para as cerimónias e com as cores garridas, douradas, além de recriminar alguns elementos mais poderosos por usarem grandes anéis, acho isso uma afronta!
-   Compreendo, penso da mesma forma. – Responde-lhe ela.
-   Além disso, não havia hierarquias, era somente Deus, o seu Filho Jesus, os seus discípulos e seus seguidores, - Continua ele.
-   Verdade! – Concorda ela.
-   Por isso não consigo aceitar que me dêem ordens, com ares de superiores, ao ponto de não obedecer em nada, apenas fazia aquilo que achava correcto, o que o meu coração, a minha consciência e a minha alma me guiavam e levavam a fazer.
     Por isso aceitei o meu castigo, rezando sempre a "Meu Pai", e esperando pacientemente a minha hora. – Explica Emanuel melancolicamente.
-   Que sofrimento! – Exclama Sofia.
Faz-se um silencio profundo, prolongado, não havia mais palavras. Já era tarde, quando Sofia olha o relógio e disse: - Ai como o tempo passou... Tenho de ligar o forno, para o peru...
-   Precisa de ajuda? – Pergunta o pedinte.
-   Só da companhia. – Responde ela sorridente.
Levantam-se os dois e vão para a cozinha.
-   Sofia, a menina também passou por muito, creio... – Diz Emanuel tentando quebrar o silencio.
- Sim, vivia com os meus pais, cedo ficaram doentes e tanto um como o outro sofreram de doença prolongada, só me tinham a mim, por  isso estive presente até morrerem.                                   Quando olhei bem para mim estava um caco, de um momento para o outro fiquei sozinha, sem ninguém, mergulhada na solidão, sem amor-próprio, enfim... Deixei-me abater. Graças a Deus, algo que não sei explicar, fez-me acordar para um mundo novo. Mesmo que dure só nesta época Natalícia, já me darei por feliz. – Diz Sofia entusiasmada.
-   Hum, Cheira bem... – Diz o pedinte,
- Mas a menina ainda vai ser feliz, acredite em mim! – Diz Emanuel.
O jantar estava uma delícia mas Emanuel olhava e ficava com um ar de pena pois não conseguia esquecer nem esconder a angústia, pelo que Sofia por fim pergunta: - Que nostalgia é essa? Em que pensa? - Não está feliz?
-   Claro que estou, eternamente grato, mas ao olhar tanta comida... dizia ele quando Sofia o interrompeu: - Sabe, parece um exagero não é? Nada disto se vai estragar acredite, pensei em retirar uma parte para amanhã para nós e se estiver disposto, depois da Missa do Galo podemos distribuir aos desprotegidos um pouco de tudo. O que acha?
Emanuel estava de boca aberta, não conseguia acreditar, parecia que ela tinha lido os seus pensamentos.
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

Aquela mulher não existia, só podia ser um anjo, mas ele sabia que era uma pessoa normal e precisava de ajuda, assim a sua missão seria ocupar-se de a proteger.
Concordou com ela, só que sugeriu saírem mais cedo e fazer a distribuição de comida naquele momento, pois outros voluntários já andariam pelas ruas a distribuir bebidas quentes e mantas. Seguiram á meia noite á Missa do Galo e algo aconteceu...
O padre que rezava a missa, reconheceu Emanuel, o que no final se dirigiu a ele.
-   Emanuel espere! Não vá embora, preciso de falar consigo, é urgente! – Diz o Padre Pedro.
-   Como está Padre Pedro? -Cumprimenta-o Emanuel.
-   Padre tem de voltar á Paróquia! Recebemos um documento que referia que tinha sido cometido um erro crasso contra si... Pode e deve voltar, pelo Amor de Deus... – Implora Padre Pedro.
Emanuel sentou-se, olhou fixamente a Cruz que tinha á sua frente como se esperasse uma resposta, um sinal.
Sofia estava radiante e logo se dirigiu ao amigo, sim podia chamar-lhe assim, e disse-lhe:
-   Emanuel, este é o seu presente de Natal vindo do Céu, não o recuse!
Ele olhou-a banhado em lágrimas, estava ali o sinal, a sua resposta, mas desta vez iria ser diferente, ai se ia... Deixaria a Paróquia por conta do Padre Pedro e ele dedicar-se-ia a levar conforto aos mendigos com quem tinha partilhado todos os momentos da sua vida depois de ter sido obrigado a abandonar a igreja.
Não só lhes levaria auxilio material, como espiritual, era essa a sua missão! Estaria a cumprir as Palavras de Deus, á sua maneira, do modo que achava mais justo e de acordo com o que acreditava ser a melhor maneira de divulgar as Mensagens Poderosas do Pai.
E assim não teria mais problemas com os ditos "superiores".
Sofia entretanto interrompe os seus pensamentos e pede-lhe: - Por favor, fique pelo menos hoje e o dia de amanhã comigo.
Ele acedeu ao pedido dela e iria ter com o Padre Pedro no dia vinte e seis de Dezembro pela manhã bem cedinho, para tratarem dos seus assuntos.
Chegados a casa, Sofia prepara o sofá cama para o seu amigo especial. Este sorri, não esconde a alegria e felicidade que sente.   
Sofia mais uma vez interrompe-o nos seus pensamentos e diz-lhe:
-   Não sei porquê, não me pergunte como, mas pressenti que teria alguém nesta noite como companhia, alguém muito especial, por isso tenho um presente! Não é nada de especial, mas quase de certeza que gostará!
Ele abre a lembrança ainda espantado, e mais espantado fica ao ver um cordão de prata com um crucifixo. Era lindo... Estava sem palavras... Parecia um sonho do qual não queria acordar.
-   Sofia... Sofia... Sofia... jamais a esquecerei, escute bem o que lhe vou dizer!
Eu tenho de seguir o meu caminho, cumprir a minha missão, seguir o meu destino, sempre a protegerei, mas em breve terá um desgosto!
Não se assuste, não se preocupe, atrás dele virá a sua felicidade, não me faça perguntas, apenas guarde na sua memória o que acabei de lhe dizer... – Diz-lhe Emanuel em tom grave.
-   Mas – Interrompe-o Sofia.
-   Não há mas... Tenha fé e não se esqueça de mim! – Pede – lhe ele.
-   Nunca! – Diz Sofia em lágrimas, não percebia o que ele dizia, parecia uma profecia e ela estava assustada.
-   Também tenho um presente para si, mas até tenho vergonha de lho dar. – Comenta ele.
-   Nada disso... Quero! Será uma boa recordação deste ano especial e em que nasceu a nossa amizade tão bonita. – Diz Sofia.
Ainda um tanto envergonhado, Emanuel estende as mãos entregando a Sofia uma cruz feita com dois raminhos de oliveira unidos com um cordel.
-   É o que tenho no momento! A única posse que tenho, e será, juro por Deus, é..., é de coração que a ofereço, quando a Sofia estiver triste, olhe para ela e lembre-se de mim! – Diz-lhe Emanuel com carinho.
-   Este é o presente mais valioso que recebi até hoje, entregue por um anjo! – Diz Sofia muito emocionada.
Por fim acabaram por ficar o resto da noite acordados na conversa como se fossem dois irmãos que não se viam há anos. De manhã vestiram os casacos e foram para a rua, apreciar tudo em redor, ele foi mostrar-lhe o banquinho de jardim onde costumava dormir, sentaram-se e olharam o Céu como ele costumava fazer, á noite para contemplar a lua e as estrelas, suas companheiras nas noites em que se sentia muito só.
Como era bom sentir o Sol, o cantar dos passarinhos, as vozes das crianças que brincavam no parque. Tinham de aproveitar bem aquele dia de Natal, pois no dia seguinte cada um partiria para as suas novas vidas. Qualquer um deles tinha perspectivas diferentes mas a sua realização pessoal estava no bom caminho.
O dia passou calmamente, em Paz, com muita alegria, mas chegando a noite um pouco de nostalgia apoderou-se dos dois. Tinha sido um bonito sonho de Natal, mas estava a chegar ao fim. Estavam cansados, por isso disseram umas orações em conjunto e foram descansar.
Manhã seguinte ao despedirem-se, Emanuel disse-lhe: - Sofia, não esqueça do que lhe disse, não se deixe abater mais, de resto se precisar, procure-me! Sabe que estarei com "eles" nas ruas da cidade, estarei por perto, de certeza que nos encontraremos.
-   Eu sei que sim! – Diz Sofia. – Se precisar já sabe onde moro, se bater á minha porta será sempre bem-vindo!
Como já acontecera antes, Emanuel pega na mão dela e beija-a fazendo de seguida uma Cruz na testa dela abençoando-a:
- Vai em Paz minha irmã... Que Deus te abençoe!
Por muito que fosse doloroso, tinham de se separar e continuar com as suas vidas.
Sofia continuava a surpreender os colegas e a ter uma outra atitude consigo mesma, melhorando de dia para dia.
Estava quase no Ano Novo e queria muito celebrar junto de Emanuel e dos seus amigos de rua, tal como tinha acontecido no Natal antes da Missa do Galo.
Emanuel por sua vez, cumpria com o que tinha prometido, auxiliava dia e noite os pobres, abandonados, os sem abrigo e de vez em quando vigiava Sofia sem que ela o soubesse.
Chegando a Véspera do Ano Novo, Sofia estava muito atarefada a preparar comida gostosa e a separa-la por diversas caixas, sabia que á noite iria estar com o seu amigo a distribuir mantimentos por aqueles a quem a vida teimava em não dar uma outra hipótese.
Quando já tinha quase tudo terminado e preparado, teve um pressentimento, uma mistura de sensações, de medo e felicidade ao mesmo tempo. Mas os seus pensamentos foram interrompidos pelo toque da sua campainha. Era ele de certeza!
Abriu a porta com um grande sorriso, mas não era Emanuel. Mas sim o Padre Pedro.
-   Olá Sofia, lembra-se de mim? – Pergunta o Padre.
-   Claro que sim, é o Padre Pedro, pensava que era o Emanuel! – Diz ela sem desarmar o sorriso.
-   O Emanuel pediu-me que viesse buscá-la, disse que não a avisara mas tinha a certeza que estaria preparada. – Diz-lhe ele.
-   Estou sim! O senhor Padre vai-nos acompanhar? - Pergunta ela entusiasmada.
-   Claro que sim, creio que a Divina loucura de Emanuel é contagiosa. – Diz o Padre Pedro a sorrir.
-   Então ajude-me por favor a levar tudo o que preparei para os nossos amigos de rua. – Diz Sofia com ar de mandona.
-   Valha-me Deus, tanta coisa! – Diz o Padre espantado ao ver a montanha de caixas que Sofia tinha na cozinha.
-   Nada é demais para aquelas pobres almas. – Responde ela.
E saíram os dois ao encontro de Emanuel que os esperava num barracão abandonado, junto de uma multidão de sem abrigos.
O Padre Pedro tinha também apelado á caridade dos seus paroquianos para que oferecessem roupas novas e mantas quentinhas.
Aquele barracão estava abandonado há muito tempo, por isso Emanuel tinha preparado algumas condições para que aquelas almas abandonadas pudessem desfrutar daquele abrigo. Reinava ali naquela noite a felicidade, ouviam-se risos, algumas melodias religiosas, parecia que o mundo tinha deixado para trás a pobreza, a fome e até as doenças.
Parecia um conto de fadas! Mas a realidade era bem outra e uma tragédia estava quase a acontecer... Sem que ninguém desse por isso, duas carrinhas com marginais aproximavam-se. Chegados ao local começaram a derramar bidões de gasolina e atearem o fogo.
De repente, aquilo que parecia um abrigo de Paz e amor, transformou-se num inferno de chamas, de gritos, de pavor.
Emanuel, Pedro e Sofia tentavam desesperadamente salvar todas aquelas vidas, encaminhando-as para uma outra saída do lado de trás do barracão.
Emanuel foi então até á entrada para ver quem tinha feito tal maldade, semelhante acto tresloucado, imundo...
Sofia corria também até á entrada para chegar até uma cabina telefónica para chamar a policia e os bombeiros. Enquanto corria que nem uma louca, ouviu o som de disparos de armas de fogo o que tanto o pânico e o desespero caíram sobre ela.
Quase nem conseguia falar, gritava ao telefone para o cento e doze, descrevendo o local e o crime.
De volta aos seus amigos que tinham ficado para trás, encontrou o Padre Pedro lavado em lágrimas e Emanuel em seu colo esvaído em sangue. Tinha sido baleado várias vezes ao tentar proteger o seu amigo. Sofia desata num pranto!
Com muita dificuldade, Emanuel diz-lhe: - Sofiaa... Lembra o que... eu disseeee. Quero ir em Pazzz, a minh.. missão foi cumpridaaa.... Não me esque....
Já não pode terminar, pois já tinha chegado a sua hora. Tinha partido!
Ouviam-se agora sirenes de bombeiros e de vários carros de policia.
Um agente dirigiu-se a Sofia e diz-lhe: - Menina...
Mas mal se olharam, surge por minutos um silencio sem fim... Olham-se fixamente, mas as suas vozes estão caladas, não querem sair, até que um outro agente interrompe aquele momento misterioso e pede para que Padre Pedro e Sofia os acompanhem até á esquadra para prestarem declarações.
Ainda quase em choque tanto Sofia como Padre Pedro relata tudo em pormenor o que facilitou a captura dos marginais poucas horas depois.
O agente Paulo, o que tinha ficado quase que enfeitiçado perante Sofia, foi dar a noticia, coisa que Sofia não aguentou mais a pressão e perdeu os sentidos.
Acordou no hospital e de seu lado estava o agente Paulo que a vigiava atentamente, ao mesmo tempo que deliciado olhando-a com uma imensa ternura.
Sofia sorriu, que bom acordar e ver aquele rosto! Mas o que estaria a acontecer? Mal o conhecia e estava tão feliz de o ter ali perto.
Padre Paulo, entra e fica com uma expressão de felicidade.
Emanuel tinha previsto o sucedido e contara-lhe que Sofia finalmente iria conhecer o amor da sua vida.
Um ano tinha já passado desde a tragédia, mas Padre Pedro estava feliz!
Estava a preparar-se para uma cerimónia especial... Um matrimónio!
Paulo e Sofia resolveram dar o nó, mas sem convidados, apenas umas testemunhas, mas exigiram que fosse Padre Pedro a casá-los.
No fim da cerimónia Padre Pedro entra em transe e com a sua voz alterada começa a falar pausadamente: - Sofia, meu anjo, lembras-te do que te falei?
Paulo, continua a fazer cumprir a justiça pois é essa a tua missão! Protege o meu anjo, que em breve te dará uma novidade linda.
Padre Pedro sente de novo um calafrio, ficando com o olhar de espanto, perante os seus amigos. Ninguém iria revelar nada do que se tinha passado ali. Era algo de muito precioso e só pertencia a eles.
Poucos meses depois, surge a grande revelação, Sofia estava grávida!
Tudo se cumpria conforme aquela estranha profecia que tinha sido enviada, no momento em que se celebrava o casamento e onde os amigos de Emanuel estavam reunidos. Ele tinha lá estado, não em presença, mas o seu espírito esteve presente e tinha feito sentir-se.
Meses mais tarde já em casa com o seu filho, Sofia e Paulo preparavam-se para o baptizado do menino.
Junto ao berço, naquele dia tão importante, Sofia coloca a Cruz de ramos de oliveira que alguém lhe tinha oferecido com todo o amor, carinho e ternura.
Paulo com o seu filho ao colo observa-a e prepara-se para lhe fazer uma grande surpresa, dar-lhe-ia uma grande prova do seu amor.
Na Igreja, Padre Paulo celebra o Baptizado sendo ele próprio o Padrinho da criança e D. Graça a esposa do chefe de Sofia, a Madrinha.
Porém existia um problema!
Nunca tinham chegado a um acordo no que diz respeito ao nome que iriam dar á criança.
Quando Padre Paulo perguntou como se iria chamar o bebé, Paulo sem perder um segundo, mostrando todo o seu amor por Sofia diz:

-   EMANUEL! EMANUEL DE JESUS!



FIM

Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

Finalmente li. Muito bonito, Margarida. Afinal Emanuel não era o príncipe encantado que eu supunha. ;),Mas houve príncipe, só podia.


Beijinho

templa
Templa - Membro nº 708

Obrigada Templa...

Estas são algumas das maluquices que escrevo... eheheheh

Foi um livro muito especial, e que teve muita saída...

Está para breve um cómico, vai estando atenta ao forum que depois divulgo.

Tive pena este fim de semana de não ter conhecido ninguem do pp, no Porto mas paciência fica para uma outra vez.

Jinhos
Margarida
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!

que história linda,Margarida!!!!Parabéns! ;) Adorei! ;D

Obrigada Nita

Agora imagina que a escrevi a primeira vez com apenas 13 anos....
Sou como sou, quem gosta, muito bem.
Quem não gosta, paciência!
Viva a liberdade de escolha!