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  • Aborto e Espírito
    Iniciado por Ligeia
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Ligeia
Boa tarde!
Quanto ao título do tópico e o qudro em que o insiro, tenho dúvidas se serão os acertados, mas tem que ver com a questão que pretendo aqui colocarHá uns tempos, em conversa com uma colega a propósito das implicações morais (entre outras) do aborto (voluntário, não espontâneo), a coisa foi fluindo e eis que, muito segura de si, a senhora me diz: "quem aborta deixa um espírito em sofrimento que para sempre acompanhará quem abortou". Fiz uma "leitura psicológica" do que me foi dito e a colega, apercebendo-se, tratou da correcção: "é o espírito do feto que fica retido e permanece ancorado a quem o devia gerar, trazendo um sofrimento e uma dívida que não chegarão mil reencarnações da 'mãe' para as sanar".
Ora bolas, a minha 'deformação racional' tolda-me a interpretação do que me foi dito (até porque em questões de espírito sou francamente pobre e limitada). Porém não descarto eventuais realidades ou crenças, ao que gostaria de perceber se o que me foi dito tem algum fundamento (doutrinário ou outro). Porque um feto abortado, no mundo material em que vivemos, é apenas isso, uma potência de vida que não se concretizou; Falar de espírito, alma, centelha (ou o que entenderem) num feto de semanas, não completamente formado, sem consciência... Confesso que me baralha. Se alguém estiver dentro da "temática" ficaria grata se me pudessem explicar um pouco acerca desta interpretação do aborto e suas consequências espirituais para o abortado (provavelmente um título melhor para o tópico, mas não estou certa!).

Grata desde já  :)

É um assunto muito interessante!  :)
Apesar de não poder oferecer, por assim dizer, ajuda porque nunca me deparei com tal assunto ofereço a minha opinião pois o tema é deveras interessante.
Do meu ponto de vista não creio que o feto fique preso à mãe, isto porque tal como mencionou é uma potência de vida que não se chegou a formar e portanto não tem consciência. E como também tenho as minhas duvidas em relação à reencarnação, não acho plausível o argumento utilizado pela senhora.
Porém era muito interessante conhecer outros pontos de vista.  :)

Ligeia
ScaredyCat, obrigada, pelo menos assim já não estou sozinha com a "dúvida"   ;D
(por favor trata-me por tu, se assim te convier  ;))

É que a convicção da minha colega é tanta (tal como a serenidade com que o afirma) que fiquei um bocado "inquieta"... Sei que consciência e espírito são distintos, mas não os consigo encarar tão separadamente quanto isso...


TinaSol
#3
Acho que a reencarnação aborda este assunto, apesar de não ter conhecimentos para tal e pq a reencarnação é um assunto que ainda não estou em crer.
Na minha opinião, pelas pessoas que tive oportunidade de saber que praticaram, o comportamento depende mesmo da pessoa que o faz, isto é: há pessoas que o fizeram e apesar de não gostarem de ter feito entenderam que era a melhor decisão e lidam bem com isso, há pessoas que utilizam o aborto como meio contraceptivo e estão-se nas tintas para a consciência, e há mulheres que após terem feito, arrependem-se, e não conseguem superar o aborto e vivem mal com o que fizeram, talvez este seja o sofrimento que é referido no conteúdo do teu post.
O tema do aborto é interessante mas muiiiiiiito pessoal, respeitando a consciêncis e liberdade individual, no meu caso, o mais certo era não fazer e seria uma decisão extremamente penosa se tivesse mesmo que o fazer, e sabendo como sou, o mais certo seria viver com um remorso a consumir-me para o resto da vida.

O tema do aborto é interessante mas muiiiiiiito pessoal, respeitando a consciêncis e liberdade individual, no meu caso, o mais certo era não fazer e seria uma decisão extremamente penosa se tivesse mesmo que o fazer, e sabendo como sou seria viver com um remorso a consumir-me para o resto da vida.

[/quote]

Pois, eu também. Se bem que neste momento me encontro na situação inversa- estou a tentar engravidar mas descobri que tenho uma deficiência em 2 hormonas vitais para a gravidez. Mas cada qual sabe da sua vida, este é sem sombra de dúvida um assunto extremamente delicado.

Talvez por não encontrar nenhuma lógica na relação feto/espírito seja o que faz de mim céptica nesta matéria, mas é claro que nem tudo tem uma explicação com lógica.

chacalnegro
Eis uma questão da maior importância. Aparte as considerações ética e moral, coloca-se outra questão que acho pertinente e em relação directa com o tópico: É admissível que o feto tenha alma, ou virá a ter em consequência do nascimento? Também vou esperar por outras opiniões, porque não tenho a minha formada, nem qualquer dado ou informação sobre a posição dos mais variados grupos religiosos/espirituais/filosóficos.

P.S. isto é uma pergunta meramente teórica e não visa especular sobre a existência da alma, antes, partindo do pressuposto que existe, como se aplica a este tópico em concreto.

TinaSol
#6
Citação de: chacalnegro em 22 fevereiro, 2012, 14:31
Eis uma questão da maior importância. Aparte as considerações ética e moral, coloca-se outra questão que acho pertinente e em relação directa com o tópico: É admissível que o feto tenha alma, ou virá a ter em consequência do nascimento? Também vou esperar por outras opiniões, porque não tenho a minha formada, nem qualquer dado ou informação sobre a posição dos mais variados grupos religiosos/espirituais/filosóficos.

P.S. isto é uma pergunta meramente teórica e não visa especular sobre a existência da alma, antes, partindo do pressuposto que existe, como se aplica a este tópico em concreto.

para o tema julgo ser uma boa questão. Queria ver se não baralhava a ética e o conceito reencarnação.
Segundo sei, os movimentos que condenam o aborto (acho que a grande maioria são religiosos) dizem que o feto é uma vida, daí dizerem que é matar. Seguindo esta lógica, haver vida, o feto teria alma, não?  Ou a alma não nasce com cada indivíduo? é formada mais tarde, quando?
Faço outra pergunta: então nos casos em que o feto tem uma deficiência enorme, porque se sabe da vida que será para uma pessoa nestas condições, os pais sofrem pq não queriam abortar mas devido ao medo e à preocupação de um dia faltar à criança por ela estar condenada a uma vida vegetativa, também aqui tem essa dívida?
Há uma situação que não entendo nas pessoas que assumem uma posição rígida de ser contra o aborto assumindo que é uma vida logo que é gerado, mas depois nos casos de deficiência dizem que já é aceitável, mas afinal em que ficamos? Pois se assim for, deficiente tb seria uma vida.
Creio que os médicos (para me referir à ciência), também eles têm esta dúvida, a partir de quando se pode considerar uma vida, já trabalhei com alguns há uns anos, e nessa altura, dependia de cada um.
Estive a ler um pouco sobre a reencarnação segundo o Espiritismo (sites baseados em Kardec principalmente), muito resumidamente, segundo estes a reencarnação ou união do espírito ao corpo dá-se na altura da concepção e que o aborto só é aceitável quando a vida da mãe fica em risco. Ao eliminar a vida estaria-se a tirar a oportunidade do reencarnado em evoluir.

Era bom que alguém entendido nesta matéria opinasse.

Ligeia
Citação de: chacalnegro em 22 fevereiro, 2012, 14:31
Eis uma questão da maior importância. Aparte as considerações ética e moral, coloca-se outra questão que acho pertinente e em relação directa com o tópico: É admissível que o feto tenha alma, ou virá a ter em consequência do nascimento? Também vou esperar por outras opiniões, porque não tenho a minha formada, nem qualquer dado ou informação sobre a posição dos mais variados grupos religiosos/espirituais/filosóficos.

P.S. isto é uma pergunta meramente teórica e não visa especular sobre a existência da alma, antes, partindo do pressuposto que existe, como se aplica a este tópico em concreto.

É mesmo isso, Chacalnegro  ;) Partindo do pressuposto que a alma existe assim que o ser vive (seja qual for o estádio de formação em que se encontre), que se dá um aborto voluntário, o que é que acontece a essa alma? Para todos os efeitos foi "assassinada" (de acordo com a posição da minha colega) e, como tal, a homicida terá um espírito para sempre "agarrado" a si... Ontem perguntei-lhe de onde retirara tal informação e mencionou-me que estava num grupo de estudo denominado Pró-Vida (movimento iniciático de integração cósmica, que nada tem que ver com os movimentos pela vida, - contra aborto - a que imediatamente associei).
Independentemente da filiação filosófica ou espiritual, creio que e um tema interessante para quem partilha da filosofia, crença ou doutrina espiritista. Ou será que quem se insere no espiritismo não se depara com a realidade do aborto?...

Grata a todos que têm participado!  ;)

eu penso que pode ser verdade, mas pensando no que se passa hoje em dia espero que a alma seja "atribuída" ao nascimento..... ao primeiro fôlego....
Don´t be afraid

Mephisto
#9
Tema delicado e controverso.

Visão espirita:
«A doutrina espírita, ou espiritismo, defende a vida humana de forma ampla, apontando como um erro a opção de abortar. A grande fonte doutrinária que suporta esta ideia é a obra de Allan Kardec, editada em 1.ª edição em paris, França, em meados do século XIX, intitulada «O Livro dos Espíritos».


Nesta obra, apenas se admite como sensato o aborto provocado para salvar a vida da mãe, uma vez que é justo assegurar uma vida que já existe em desfavor de uma que é incipiente naquela altura. Para a doutrina espírita, distanciada de uma visão artificial, mecanicista, da vida, o feto não é um mero amontoado de reacções bioquímicas em cadeia, susceptível de ser anulado em qualquer altura por um qualquer motivo. Na óptica espírita, o feto é a materialização de um regresso à materialidade das formas de um ser imortal, o Espírito. A preparação da sua vinda — chamada de reencarnação — começa antes mesmo da fecundação. Contudo, é a partir desse momento que se estabelece a ligação do Espírito ao corpo de uma forma progressiva. A interrupção deste processo levanta diversos problemas, desde traumas de rejeição à carência de situações de reajuste entre uns e outros, conforme a literatura espírita aborda sobejamente por via mediúnica. Uma interpretação do momento que se atravessa em Portugal é esta: mais importante do que o quadro legal existente em dado momento da história, proibitivo ou não, é a consciência de que quem não quer ter (mais) filhos deve ser responsável e precaver-se com os métodos anticoncepcionais adequados. A vida humana é um assunto demasiado sério para ser tratado como um erro vulgar.»
Fonte: ADEP

Livre arbítrio e aborto entre católicos: (Fala na questão do espírito)
«A doutrina católica apostólica romana sobre o aborto é plural, apesar deste fato ser quase completamente desconhecido no esfera pública internacional. Existe uma tradição forte em favor de livre arbítrio e uma tradição conservadora contra o livre arbítrio no que tange o tema aborto. Nenhuma delas pode ser chamada de a doutrina oficial, tampouco existe uma que seja mais católica do que a outra. A hierarquia eclesiástica, há vinte séculos, apresenta a doutrina católica como única, ou seja, como se houvesse um consenso unânime afirmando que o aborto é proibido. Porém isto não é verdade. Ao revelar esta autêntica abertura com relação ao aborto e à contracepção existentes no seio mesmo das tradições católicas, a doutrina contra o livre arbítrio, defendida pela hierarquia eclesiástica, torna-se apenas um ponto de vista (católico) entre muitos.

A Bíblia não condena o aborto. Por exemplo, em Êxodo 21:22, que fala do aborto espontâneo causado por acidente, a lei impunha um castigo financeiro para o homem que, "durante uma briga", causasse um aborto espontâneo por acidente. Este trecho trata do direito do homem a descendência. Ele pode receber uma multa como castigo, mas não pode sofrer a lei do "olho por olho" como se tivesse matado uma pessoa. Desta maneira, como disse o teólogo conservador John Connery S. J., "o feto não tinha a mesma categoria da mãe na lei hebraica", quer dizer, não possuía o estado moral de uma pessoa. Isto é o que diz a Bíblia sobre este assunto.
A história dos primórdios da igreja segue o exemplo das escrituras em relação ao aborto e fala disto apenas de forma acidental e esporádica. De fato, não existe um estudo sistemático desta questão até o século XV. Tertulião, escritor primevo da igreja, escreveu sobre o aborto de emergência nos momentos finais de uma gravidez, quando um médico tinha que desmembrar o feto para removê-lo. Tertulião se refere a esta medida extrema como "crudelitas necessária", ou seja, uma necessidade cruel. Evidentemente, isto equivale a uma aprovação moral daquilo que muitos chamam erradamente de um "aborto de nascimento parcial".

Há uma doutrina dominante no cristianismo, que foi também desenvolvida nos primórdios da Igreja, é a teoria da "hominalização" tardia, ou seja o momento em que a alma anima o corpo. Emprestada dos gregos, esta teoria afirma que a alma humana só animava o feto por volta do terceiro mês de gravidez. Antes disso, qualquer forma de vida existente não era considerada humana. Desta forma afirmava-se que o embrião era habitado primeiramente por uma alma vegetal, depois pela alma animal, e só quando estava suficientemente formado é que a alma espiritual humana habitava o corpo (Ver, p.e., São Tomás de Aquino, Summa Theologiae 1, q. 118,2 ad 2). Apesar de alguns esforços de cunho claramente machista tentarem estabelecer uma diferenciação entre homens e mulheres, afirmando que a alma humana habitava mais cedo o corpo masculino do que o feminino - em torno de um mês e meio após a concepção -, no entanto, o que era comumente aceito é que o embrião atingia a etapa de conceptum humano (corpo e alma) por volta do terceiro mês (ou até mais tarde) de gravidez.
Christine Gudorf afirma que a perspectiva pastoral comum considerava que "o momento em que a alma animava o corpo ocorria somente quando a mãe podia sentir o primeiro movimento do feto, normalmente durante o quinto mês. Antes disso, o feto não era considerado uma pessoa humana. Esta era a razão por que a igreja católica não batizava fetos de abortos espontâneos, nem crianças que morreram ao nascer." Por isso, ao refletir sobre a crença de que todos os mortos ressuscitarão por ocasião do fim do mundo, Augustino ponderou se os fetos abortados ressuscitariam também. E conclui que não. Acrescentando que tampouco todos os espermas da história poderiam ressuscitar (Graças a Deus!) (lembremo-nos de neste momento acreditava-se que os espermas eram considerados homúnculos).

Teólogos católicos latino-americanos em estudo recente concluíram que: "Ao que tudo indica, os textos dos primórdios da igreja que condenam o aborto se referem à prática realizada quando o feto já estava completamente formado". ("Problemática religiosa de la mujer que aborta", Universidad Externado de Colombia, 1994) O feto no início de seu desenvolvimento não possui o status de "pessoa", portanto "matá-lo" não poderia ser considerado o mesmo que "assassinar".

A idéia da "etapa hominal" tardia persistiu ao longo da tradição católica. Por exemplo, São Tomás de Aquino, o mais célebre teólogo da idade média, também defende este ponto de vista. Portanto, a doutrina mais tradicional e impregnada do cristianismo católico considera que abortos realizados no início da gravidez não podem ser homicídios. Posto que a maioria dos abortos, hoje em dia, são realizados no primeiro trimestre da gravidez, de acordo com essa doutrina católica, não podem ser chamados de assassinatos. Da mesma forma, uma gravidez interrompida através do uso da droga RU 486 não pode ser caracterizada como um ato de "matar uma pessoa", de acordo com a perspectiva da "etapa hominal" tardia. O Padre Joseph Donceel, S. J., também está de acordo com esta perspectiva: "o embrião não é, certamente, uma pessoa humana durante os primeiros meses da gravidez, e conseqüentemente não é imoral interromper uma gravidez durante este período, contanto que haja razões sérias para a tal intervenção".

O Padre Karl Rahner, S. J., a quem muitos consideram ser o primeiro teólogo católico do século XX, também acreditava na idéia de "hominalização" tardia. Ele escreveu em seu livro Dokumente der Paulusgesellschaft, de 1962, que "não se pode interpretar, através das definições dogmáticas da igreja, que assumir que o conceptum humano (alma e corpo) ocorre somente durante o curso de desenvolvimento do embrião seja que contrário a fé. Nenhum teólogo pode pretender provar que a interrupção de uma gravidez, ou seja a realização do aborto, seria em toda e qualquer circunstância o assassinato de um ser humano". Bernard Haring, o estimado teólogo de Redemptoria, também defende a idéia da "hominalização" tardia. Desta maneira, eles demonstram ser autênticos seguidores da doutrina católica tradicional.

No século XV, o santo arcebispo de Florença, Antoninus, dedicou-se muitíssimo ao estudo do aborto. Ele era favorável ao aborto realizado no início da gravidez para salvar a vida da mãe. Um posicionamento favorável em que estavam de acordo muitos outros membros no contexto da medicina do século XV. Isso se tornou um consenso comum na época. Inclusive não houve por parte do Vaticano nenhum tipo de crítica ou mesmo censura. De fato, Antoninus mais tarde foi canonizado como santo e se tornou um modelo a ser seguido por todos os católicos. Porém hoje em dia, muitos católicos não sabem que este santo, arcebispo e dominicano durante sua vida eclesiástica esteve a favor do livre arbítrio com relação ao aborto.
No século XVI, o influente Antoninus de Córdoba afirmava era possível lançar mão de um remédio que causasse aborto, mesmo durante uma gravidez adiantada, se isto fosse necessário para assegurar a boa saúde da mulher. A mãe, ele insistia, possuía jus prius, direito por antecedência. Interessante notar que algumas das doenças que ele menciona não são realmente escolhas entre vida ou morte para as mulheres, mesmo assim remédios abortivos eram moralmente permitidos. O teólogo jesuíta Tomás Sanchez, falecido no início do século XVII, afirmava que todos os teólogos contemporâneos seus aprovavam o aborto quando realizado no início da gravidez para salvar a vida da mulher. E nenhum destes teólogos ou bispos foram censurados por defender este ponto de vista. E como dissemos acima um deles, Sto. Antoninus, foi inclusive canonizado. Sua perspectiva doutrinária a favor do livre arbítrio com relação ao aborto foi considerada completamente ortodoxa e ainda pode ser considerada assim hoje em dia.

No século XIX o Vaticano foi convidado a participar de um debate sobre um aborto no fim da gravidez, o qual requeria o desmembramento do feto (já formado) para salvar a vida da mãe. Em 2 de setembro de 1869, o Vaticano recusou-se a discutir o assunto e endereçou o requerente aos ensinamentos da teologia para obter resposta a sua consulta. Em outras palavras, era a responsabilidade dos teólogos discutir o assunto livremente e chegar a uma conclusão. A decisão não era do âmbito do Vaticano. Esta modéstia tão apropriada e a falta de inclinação para intervir tratavasse de um modelo antigo e sábio o qual poderia servir de exemplo para o Vaticano.

O que esta breve incursão pela história procura demonstrar a existência, de fato, de uma doutrina católica a favor do livre arbítrio em relação ao aborto, e outra contra. No entanto nenhuma delas pode ser considerada como a doutrina oficial, ou como sendo a doutrina mais católica ou a mais autêntica. A perspectiva favorável do direito moral ao aborto por razões sérias é, de fato, a que prevalece nas principais religiões do mundo incluindo-se o catolicismo. Ainda que esta perspectiva permaneça no mais das vezes subvertida pelos discursos religiosos conservadores.

Nós católicos somos livres para tomar nossas próprias decisões conscientemente segundo estes fatos históricos. Nem sequer os papas dizem que a doutrina que proíbe o aborto sob qualquer situação e todos os métodos contraceptivos é infalível. De fato a perspectiva sobre o aborto, como diz Gudorf, é uma perspectiva que está sem desenvolver. O aborto não era "o modo favorito de controle da natalidade porque, até meados do século XX, era extremamente perigoso para a mulher". Não havia um ensinamento católico coerentemente que pudesse servir de orientação sobre o assunto, como pudemos observar, e ainda não existe. Alguns estudiosos católicos, hoje em dia, dizem que todo o aborto é pecado, outros dizem que há exceções no caso de risco de vida da mulher, gravidez indesejada resultante de estupro, deformidades genéticas do feto e outras razões igualmente sérias. Com o que sensatamente conclui Gudorf, "A melhor evidência demonstra que a doutrina católica não está completamente estabelecida, ao contrário encontra-se em pleno desenvolvimento atualmente".

O Probabilismo é um dos tesouros da tradição moral católica e se aplica nos casos relacionados ao aborto. Esta doutrina baseia-se na idéia de que uma "obrigação" que provoque dúvida - nas palavras de Gudorf que não fosse "completamente imutável" - não pode ser imposta como se fosse indiscutível. Ubi dubium, ibi libertas, onde há dúvida, há liberdade. A dúvida existe quando há argumentações baseadas numa probabilidade firme divergente de um ensinamento moral, porém apoiada em autoridades teológicas. Nesse caso a consciência católica é livre. O Probabilismo, desta maneira, foi um triunfo católico na defesa da consciência individual esclarecida. Dependia não da autoridade hierárquica, cuja maioria não é formada por teólogos, mas da perspicácia argumentativa - a nossa própria ou a de teólogos eruditos. Não dependia de permissão, mas da existência de pontos de vista diferentes defendidos por teólogos católicos de reputação moral consultados pelos fiéis. Em termos técnicos dentro da teologia moral católica, o direito de discordar da hierarqui eclesiástica em questões morais e poder escolher realizar um aborto por razões sérias é "possível quando baseada numa probabilidade firme".»
Fonte: religiousconsultation.org

Visão pessoal:
Francamente, é um mistério que iguala a grandeza do mistério da vida. Ninguém tem o direito de decidir esse destino fatal senão a consciência de quem carrega essa vida no seu corpo. Há quem a tenha, há quem dela seja desprovida. O juízo de valores que advém do acto, só Deus poderá pronunciar sobre essa pessoa, pois só ele é conhecedor dos mistérios que envolvem a vida e a alma. Se o espírito se torna residente do feto no acto da concepção é algo que nunca saberemos.

chacalnegro
Bom post Mephisto! Objectivo como sempre. ;)

Ligeia
Grata pelas contribuições, mais uma vez  ;)

A relação entre o livre-arbítrio e o aborto entre católicos é-me bastante familiar, não tanto por questões religiosas mas sim profissionais. O que ansiava era por ter um vislumbre de qual seria a posição do espiritismo, que obtive com a sempre oportuna e relevante contribuição do Mephisto, sendo já possível compreender ao que a  minha colega possivelmente quis transmitir.
E o que é certo é que ainda há pouco saiu um artigo na comunidade científica que aborda esta questão do aborto, do espírito e dos limites da nossa humanidade: aqui... E tem-me dado umas quantas dores de cabeça, confesso...  :-\

Bom dia, uma vez já ouvi uma médio espirita (interpretação dela) explicando justamente isso, não é que espírito fique em sofrimento atormentado a mãe ou preso a ela por mil encenações, não é bem assim, o que acontece é que aquele espírito que estava no plano superior esperando para nascer fica ligado sim a mulher que o daria a luz, mas só para cumprir o que estava determinado, que é vir ao mundo por meio dessa mulher, e ela de trazer-lo ao mundo, esse espírito ira esperar até que engravide novamente  para que ele possa nascer. Uma coisa é certa ele esperará o tempo que for preciso para cumprir às condições específicas para sua vinda ao mundo, dai a ligação do espírito com a mãe, ele precisa especificamente dela e ela dele. Feto pode não ter consciência mais o espírito dele já existe no plano superior esperando para se unir ao corpo que se forma, e se pensarmos no aborto espontâneo que culpa a mãe tem se acontecer isso nenhuma.  Espero ter ajudado.

Ligeia
Lualiz, grata pelo teu contributo  :)

No entanto, e tendo em conta o que expuseste, o que acontece se uma mulher que tenha abortado (voluntariamente ou não) não engravidar novamente? Como ficaria essa ligação mãe-filho?

chacalnegro
Citação de: Ligeia em 20 março, 2012, 21:27
Lualiz, grata pelo teu contributo  :)

No entanto, e tendo em conta o que expuseste, o que acontece se uma mulher que tenha abortado (voluntariamente ou não) não engravidar novamente? Como ficaria essa ligação mãe-filho?
Encarnavam na mesma família como é óbvio! Que pergunta...  :angel: