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  • O marido da mãe ( este texto deve ser lido em contraponto com um outro " A mãe.
    Iniciado por Templa
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É um homem educado e sereno, daqueles que, quando é preciso, pede até licença para existir. Já não é novo,  mas devia ter sido interessante na juventude, quando, um pouco mais velho do que ela, se casou. Já lá vão mais de trinta anos.

Depois de mais de 15 a viver asfixiado pela limpeza da casa onde moravam com a filha, não aguentou mais e um dia regressou, não como filho pródigo que nunca foi, mas como um homem cansado de uma mulher que não nasceu para o ser. E, mãe por mãe, preferia a sua. 
Fala pouco dos tempos em que coabitaram, mas o pouco que diz fala por si. É sobretudo quando se juntam em casa da filha e a mulher, agora só no papel, o atiça por tudo e por nada, como se ele não passasse de um cão sarnento, um portador de doenças transmissíveis a cujo convívio todos devam eximir-se.   
Devia ser já por isso que ela, quando ainda viviam juntos, punha toda a roupa, dele, dela e da casa à janela, sempre que um murcho raio de sol se estendia pelo mundo. Era para matar os ácaros, que ela não antevia mais danos colaterais a essa morte. Nem mesmo a do amor. Esse nunca tinha nascido. Como tal, nunca poderia morrer. Ou, quem sabe?,  era uma forma de se proteger do homem e dos seus direitos de marido,  no quarto e na cama que tão difícil era de partilhar. Sobretudo depois de se ter tornado mãe. 
Foi quando ele partiu para o outro lado da rua, sem tempo de regresso.   
E assim se transformou num homem sozinho e solitário, depois de trocar a solidão de um casamento por uma outra solidão onde o lixo e a ordem se vão equilibrando quotidianamente. Se tinha outras ambições, ficaram pelo caminho, perdidas entre os panos do pó e desfeitas na água em que a mulher lavou a vida dos dois, quando as mágoas de ambos submergiram à voragem da limpeza em que ela se afundou,  arrastando-o consigo. 
Hoje, contemplando a filha e os netos, vê neles o único futuro que a mulher lhe deixou. E quando, em silêncio, ouve ainda tudo quanto ela lhe diz com quatro pedras na mão a que raramente replica, vê-se-lhe nos olhos o que a boca não diz: Vidas de lixo.

Templa - Membro nº 708

Homem!... Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o Universo e os Deuses.»

Obrigada, me querido. Agora, por aqui quase ninguém tem escrito nada. Eu é que, de vez em quando, vou buscar coisas velhas...

Abraço

Templa
Templa - Membro nº 708

eu tenho escrito para os meus estudos e que muito me colhem a pouca imaginação que me resta.
ver se lá para o verão recomeço com calma.
Homem!... Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o Universo e os Deuses.»